Artigo: As redes sociais banalizaram a arte da fotografia?

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Atualizado há 10 anos

Por Douglas Marques 

Não raro ouço dizer que o barateamento dos aparelhos fotográficos, aliado a fácil exposição proporcionada pelas redes sociais, tal como o Facebook e o Instagram, tornou o ato de fotografar uma atividade banal. A crítica anexa, advinda, principalmente, de alguns profissionais da área e amantes dessa arte, é que o registro massivo de todo e qualquer instante cotidiano, sem o necessário domínio das técnicas fotográficas e sem a posse de aparelhos profissionais, só poderá resultar em algo desprovido de valor artístico. Além disso, haveria ainda uma espetacularização (termo debordiano) malfadada da vida íntima: páginas de um álbum virtual contendo uma amálgama de imagens egocentricamente frívolas fadadas a afundarem na cascata alucinante, feroz e implacável de um feed de notícias.

Muito inconveniente. Mas, por vários motivos, sinto-me inclinado a não compartilhar dessa visão apocalíptica.

A princípio, noto (alguém não notou?) que há certa empolgação na exposição de imagens de determinados fatos considerados, apenas pelo compartilhador e poucos amigos, absolutamente interessantes. “Eu na academia”, “Eu no Shopping”, “Eu no McDonald’s”, “Eu ali”, “Eu aqui”, “Eu na neve” – esse último é do autor -, #etc. No entanto, penso que esse tipo de registro fotográfico não prejudica a fotografia profissional (seja publicitária ou de exposição), não a torna trivial, pois pertence, vamos dizer, à outra esfera de interesse: o registro amador de emoções cotidianas.

Exemplos não faltam dessa linha paralela de fotografia. Se o leitor já teve a infelicidade de ser apresentado a um álbum de família, que não a sua, deve saber a que me refiro. Inclinar-se, sorrindo, para ver as imagens da pequena “Joyce”, do dia em que ela espalhou farinha pela sala toda. Ou o tio “Frederico” na famosa pescaria de domingo, suado, sem camisa, segurando uma inacreditável carpa de vinte quilos – a contemplação de momentos de alegria alheios exige sensibilidade. Temos ainda antigas fotografias amareladas exibindo pessoas em pé, dentro de ternos pretos, de colunas eretas, perfeitamente alinhadas na horizontal. Um menino sobre um asno, que foi pintado no padrão alvinegro de uma zebra. Um marinheiro e sua namorada enfermeira.

Enfim, esses registros não atingem a integridade da arte de fotografar, pois seu valor não reside na técnica usada e não tem ligação com o equipamento – aliás, sempre haverá espaço para os bons profissionais nesta área, e o mercado precisa cada vez mais deles. O interesse desses registros cotidianos reside na expressão da visão de mundo e captura imóvel de algo que tinha um grau de importância, no momento, para o fotógrafo. Se terá valor para o leitor da imagem, é ele quem decidirá.

Douglas Marques é acadêmico de Jornalismo da Uniuv