Silêncio quebrado

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Atualizado há 7 anos

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(Foto: Divulgação).

“Maioria silenciosa” é um termo pouco conhecido, mas de fácil entendimento. No Paraná o sentido da frase pode ser visto na prática: enquanto alguns poucos alunos invadem escolas, inexplicavelmente não se ouvia manifestação dos maiores prejudicados – os alunos que querem ter aulas, e cujos pais comungam da mesma opinião.

O Paraná tem 2.100 escolas estaduais, e pouco menos de um quarto delas está ocupada. Na média, os grupos não passam de duas dezenas de jovens por colégio. Reclamam da proposta federal de reforma do ensino médio. Do outro lado, dezenas de milhares de alunos não recebem ensino nenhum.

Coincidência ou não, o recesso forçado numa parcela do sistema paranaense de educação pela atitude dos invasores de escolas ganhou reforço com a deflagração de mais uma greve dos professores. Nos dois casos, o motivo alegado para interromper o ano letivo são propostas que seguem em discussão.

Na segunda-feira, 18, o que se imaginava ser a maioria silenciosa ganhou voz. Foi quando três grupos, formados dentro da imensa parcela da população prejudicada pelo fechamento de colégios públicos, apareceram no Palácio Iguaçu para defender o direito básico à educação e reclamar a volta às aulas.

Ameaças

O rosário de depoimentos feitos ao chefe da Casa Civil, Valdir Rossoni, impressiona. Quem é que tem conhecimento, por exemplo, que os alunos que defendem o direito de estudar estão sendo ameaçados? É o que garante a advogada Paula Bettega, que está assessorando juridicamente alunos e pais.

Segundo ela, há graves situações de constrangimento contra estudantes. “Eles estão com medo. Essas crianças vêm sendo ameaçadas física e psicologicamente. Não podem ficar desamparadas. São consideradas rebeldes pelos que invadiram as escolas porque são contrários a isso”, afirma.

A situação vivenciada nos bastidores das ocupações parece diferente da percepção das autoridades. O Ministério Público do Paraná, por exemplo, considerou justas as ocupações e pediu proteção aos que invadiram os prédios públicos. Conselheiros tutelares dizem que não veem nenhum problema que menores de idade participem das manifestações que fecharam escolas.

“A gente quer educação. A gente quer o direito de entrar nas escolas e ter o ensino com os nossos professores”, disse a estudante do ensino médio Aline da Silva Paiva, de 15 anos. “A invasão está impedindo que a gente possa estudar. Os professores querem dar aula, porque a maioria dos que estão fazendo greve faz isso porque não vai ter aula de qualquer forma”.

Consulta

Aline afirma que na escola onde estuda foi feita uma consulta para ver quais professores que iriam aderir à greve. Só seis foram favoráveis. “Os outros 16 falaram que iriam continuar no colégio dando aula pra quem queria estudar.  Mas aí aconteceu a ocupação e eles ficaram sem poder entrar”, relata a estudante.

De acordo com ela, várias propostas foram feitas para que os invasores permitissem que os outros alunos pudessem voltar para a sala de aula. “Aula de meia hora e, no final, a gente protestar todo mundo junto. Aula de 40 minutos e a última livre. Mas eles não aceitaram. Eles querem algazarra. Eles querem bagunça”, afirma.

Segundo Aline, a maioria dos alunos que está dentro da escola é composta de repetentes. “São alunos que já estão reprovados e alunos que, realmente, não fazem nada. Só ficam em casa assistindo a TV e não sabem nem por que estão lá dentro”.

Fernando de Souza é outro estudante que resolveu usar a voz para defender o interesse de quem quer estudar. Para ele, é preciso um debate amplo, inclusive com APP-Sindicato, mas sem a interrupção das aulas.

“Nós queremos estudar”, disse. “Então, é necessário diálogo entre o governo, os estudantes que querem ter aulas e a entidade que diz representar os estudantes, mas não representa porque se fosse isso estariam dentro da sala de aula estudando”.

Na rua

A proposta de Souza, lógica e coerente, encontra amparo na opinião dos pais de alunos que estão sem aula, que também se mobilizam para o retorno às aulas. É o caso de Cristiano Roger, que informa que há um movimento convocando pelas redes sociais toda a comunidade escolar de Curitiba para uma manifestação em favor da reabertura dos colégios.

O “protesto” vai acontecer no domingo, 23, na Praça Santos Andrade, às 14 horas, no centro da capital, e deverá reunir “pais, mães, pessoas que estão contra essa ocupação das escolas públicas do Paraná, e principalmente os estudantes reféns da situação”. Ele considera ainda que há um movimento político-partidário por trás de das invasões.

Roger engrossa o caldo daqueles que avaliam que o Brasil sofreu uma transformação radical com a recente queda da ex-presidente Dilma Rousseff e a saída do poder do Partido dos Trabalhadores (PT), a quem o sindicato dos professores do Paraná apoia, através vinculação à Central Única dos Trabalhadores (CUT).

Independentemente das questões ideológicas, o que aconteceu nesta semana é algo pouco visto no vai e vem de greves no sistema de ensino público do Paraná. Se o movimento dos que são contra os do contra vai ganhar corpo, só o tempo dirá. O fato é que, pelo menos neste caso, uma parte da “maioria silenciosa” apareceu para falar.