Elvira, a benzedeira

Ela é conhecida no Vale do Iguaçu e região pelo dom de benzer com cera de cera de abelha, água e rezas. Ela mora no bairro São Bráz, em União da Vitória

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Atualizado há 7 anos

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Elvira Lima da Silva, atende diariamente mais de 50 pessoas. (Fotos: Wannessa Stenzel)

Ela carrega consigo boas energias. Está sempre disposta em ajudar quem dela necessitar. De uma simplicidade tênue e acolhedora – bem ‘coisa’ de avó, a dona Elvira Lima da Silva ficou muito conhecida pelo Vale do Iguaçu e região. Há 30 anos ela aprendeu a benzer e não parou mais. Católica de criação, mas também entendida de outras religiões, Elvira recebe diariamente mais de 50 pessoas em sua casa, no bairro São Bráz, em União da Vitória. O trabalho inicia cedo, já às 8 horas da manhã e segue, geralmente, até às 19 horas, de segunda a sexta-feira.

A tradição passou de geração em geração, da avó para a mãe, que a ensinou. Ela é devota de Nossa Senhora Aparecida, a Padroeira do Brasil, e de muitos outros santos. Ela conta que é mãe de três meninas e cinco meninos, rodeada pelos netos e bisnetos. A intenção é repassar todo o conhecimento da benzeção para eles também.

Elvira mora com as filhas, pois está viúva há 26 anos. Os familiares dela foram todos criados com ajuda de chás e de outros remédios preparados com o que a natureza tinha a oferecer e, claro, por meio das benzeções. “Era difícil. Era assim que se curava, por meio da fé. Sem fé não adianta. As palavras de Deus têm que ‘vir sempre na frente’ porque é Ele quem faz a cura”, conta.

Dona Elvira já curou muita gente de cobreiro (uma erupção de bolhas na pele), rendiduras (dores musculares), “aguamento” – um mal que acomete a criança que fica com vontade de comer alguma coisa que viu, depressão, entre outras. Sem esquecer que muita gente procura a Dona Elvira para espantar o ‘mau olhado’.

De acordo com Dona Elvira, o que se percebe é que a benzeção não pode ser realizada por qualquer pessoa. É preciso que a pessoa tenha fé, carisma e disposição para praticar. Além disso, o poder de benzer tem que ser recebido de um benzedor, que pode passá-lo para os filhos ou vizinhos.

Na tarde de ontem

Enquanto a reportagem do Portal Vvale entrevistava a Dona Elvira, já havia uma fila de pessoas aguardando por seu atendimento. A entrevista aconteceu às 17h15, desta sexta-feira, 24.

Benzimento, está desaparecendo?

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Antônio Henrique Weitzel estuda cultura popular desde 1963. (Foto: Nathalie Guimarães/G1)

O pesquisador Antônio Henrique Weitzel é membro da Comissão Mineira de Folclore, criada em 1948. Ele estuda sobre a cultura popular desde 1963 e entrou para o grupo em 1965. De acordo com Weitzel, o benzimento teve início quando Jesus Cristo disse aos 12 apóstolos que eles deveriam curar todas as doenças e enfermidades. Mas para ele também a benzação é algo que vai se perdendo com o passar dos tempos.  “Está desaparecendo porque há falta de convivência com o sagrado. Hoje há uma descrença generalizada”, destacou.

Aliado a isso, hoje o acesso aos médicos é mais fácil do que antigamente, quando a prática era uma das alternativas para cuidar das doenças e males do povo. Em seu livro “Magia, religiosidade e superstição na cultura popular” ele reuniu materiais sobre o procedimento, rituais, palavras e gestos envolvidos nas benzeções, como o sinal da cruz.

Na obra, ele descreveu os benzedeiros como “pessoas simples dedicadas à caridade para com os doentes e necessitados de ajuda”, afirmando que eles são respeitados por praticarem o bem com desinteresse, não visando a nenhum benefício próprio.

 São João do Triunfo e Rebouças

As cidades paranaenses de São João do Triunfo e Rebouças reconheceram as benzedeiras, rezadeiras, curandeiras e costureiras de rendiduras (dores musculares) como agentes de saúde pública. Na prática, as cidades legalizaram o acesso e manipulação de ervas medicinais por essas “profissionais”, de modo a facilitar o atendimento delas à população. A ONG Masa (Movimento Aprendizes da Sabedoria) cadastrou em Triunfo em 2012, 161 benzedeiras e em Rebouças, 133. Entende-se que a medida vem para combater o preconceito contra as benzedeiras e fortalecer o elo dos que acreditam na reza.