PROJETO CONFIAR: Um ano sabendo dar ouvidos

No dia 18, projeto de escuta humanizada às vitimas de violência sexual completou um ano de funcionamento. Trabalho é delicado, mas fundamental

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Atualizado há 7 anos

 

confiar-uniaodavitoria-justiXX2aO mês é de festa para a equipe do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania, o Cejusc, de União da Vitória. É que no dia 18, o projeto Confiar, “filho” do Centro Judiciário, completou seu primeiro ano de criação. Embora a implantação oficial das atividades tenha ocorrido no dia 18 de maio do ano passado, as ações do programa já se desenvolviam de forma experimental, desde 2014, sendo um auxílio importantíssimo ao judiciário na condução de entrevistas psicológicas com crianças e adolescentes possíveis vítimas de abuso sexual.

O projeto, resultado da parceria estabelecida entre as áreas do Direito e da Psicologia, é de autoria do juiz da Vara da Infância e Juventude, Família e Anexos de União da Vitória, doutor Carlos Eduardo Mattioli  Kockanny e da psicóloga do Cejusc, Daniele Jasniewski, profissionais que de mãos dadas e cheio de capacidade, dedicaram longos meses de estudos, planejamentos, capacitações e discussões sobre a melhor forma de execução do projeto. A ideia, sempre foi, a de minimizar a revitimização das crianças as quais supostamente podem ter sido vítimas de abuso sexual.

“O Projeto Confiar tem por objetivo realizar a escuta humanizada de crianças e adolescentes que possam ter sido vítimas de abuso sexual. Como se sabe, a situação de prestar depoimentos, participar de audiências, responder às questões de juízes, promotores e advogados, frequentemente ocorre sob um clima de tensão e estresse, o que pode interferir significativamente no relato da vítima, sobretudo quando esta se trata de uma criança”, explica Daniele.

Pensando nisso, a proposta dos autores do projeto foi a proporcionar às possíveis vítimas, um ambiente acolhedor, informal, salubre e lúdico onde somente uma psicóloga e a suposta vítima estão presentes, sem interferências externas e sem o uso de qualquer equipamento de gravação (áudio ou vídeo) que possa inibir a criança.

Durante a escuta humanizada, a psicóloga segue um protocolo de entrevista forense desenvolvido nos Estados Unidos pelo National Institute of Child Health and Human Development elaborado especialmente para entrevistas psicológicas em casos de abuso sexual infantil. Além do protocolo, ela permeia sua entrevista a partir de questionamentos pré-elaborados por advogados e promotorias, para verificar há existência ou não de elementos de constatação que possam ser indicadores de abuso sexual.

“Importante destacar que o projeto não apenas promove um momento tranquilo para que a criança possa se expressar, seja pela fala, pelo brincar ou pelos desenhos produzidos, mas também, durante a entrevista a psicóloga pode identificar a necessidade de encaminhar a criança para atendimento psicoterapêutico”, completa a psicóloga. Geralmente, essa etapa é realizada gratuitamente, por acadêmicos do último ano do curso de Psicologia da Universidade do Contestado (UNC), em Porto União, e em casos onde a vítima é residente de outro município da Comarca (Bituruna, Cruz Machado, General Carneiro, Paula Freitas ou Porto Vitória), os atendimentos são realizados pela psicóloga de seu município. “Tal procedimento ocorre, tendo em vista que a proposta do projeto não é o de realizar atendimento para tratamento psicológico, mas sim, apenas desenvolver uma escuta psicológica humanizada exclusivamente para constatação de situação de abuso sexual”, destaca Mattioli.

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Psicóloga Daniele e o Juiz de Direito, Carlos Mattioli: fundamento e ouvidos atentos para quem precisa

Inicialmente, as atividades contavam apenas com o trabalho de Daniele, autora e coordenadora do projeto. Entretanto, com o aumento das denúncias, o projeto hoje conta com o exímio trabalho de outras 12 profissionais de Psicologia, todas capacitadas para o delicado trabalho. São elas: Andressa Backmann, Carol Maltauro Wechorkowski, Caroline Pucci, Elisa Plasse, Elizandra Giacomini, Francieli Roieck, Greice Dal Ri Traesel, Larissa Moretto, Luana Janiszevski, Paula Ândrea, Selma Mozeleski e Thaline Harumyi Ino.

Hoje, um ano depois de seu lançamento oficial, o projeto já conta com um espaço físico próprio, ainda em fase de reformas. Ele fica anexo a Delegacia da Mulher (na rua Ipiranga, 444). Até que as novas instalações estejam finalizadas, as entrevistas ocorrem no Fórum da Vara da Infância e Juventude, Família e Anexos de União da Vitória e desde seu início já foram atendidas aproximadamente 350 crianças, e em mais de 30% dos casos, não foi constatado abuso sexual.

Para o doutor Mattioli e para Daniele, a consolidação do projeto só teve sucesso graças ao zelo dedicado por todos os envolvidos. “Para realizar um trabalho como este, é preciso, sobretudo, ser um profissional com extrema capacidade de colocar-se no lugar do outro. Quando imaginava como seriam as ações, eu pensava: E se fosse comigo? E se essa criança fosse minha filha? Como eu gostaria que ela fosse ouvida? Em que tipo de ambiente? Ouvida por quem? Quantas vezes? Por quantas pessoas? Entre várias outras qualidades deste trabalho, penso que é o exercício constante da empatia o que torna o nosso projeto algo tão especial”, destaca a psicóloga.

Impressões

Os advogados, Soiane Rudnicki, Marcos Rubbo e Vinícius Scaramella Maros, são alguns dos advogados que participam do Confiar. Para eles, sensibilidade é a palavra que define o projeto. Afinal, defendem os juristas, a suposta vítima é tratada com respeito, evitando sofrer novamente quando ouvida. “O fundamento do Confiar é que as crianças e adolescentes, vítimas de violência sexual, são, acima de tudo, sujeitos de direitos e que a sociedade, de forma alguma, tem o direito de revitimizá-los, mesmo a pretexto da busca da verdade real e da condenação dos supostos agressores”, defende Maros.

“A escuta humanizada possibilita a dignidade da suposta vítima em ser ouvida e uma única oportunidade por profissional da área da psicologia, bem como realiza a entrevista em um ambiente preparado”, concorda Rubbo.

“Vejo o Confiar como parte da humanização da justiça, onde verdadeiramente se preocupa com a vítima, buscando sua proteção integral e o respeito ao seu superior interesse, evitando com que a criança rememore o trauma sofrido ou até mesmo participe de audiências na presença de várias pessoas e até mesmo do abusador”, endossa Soiane.

Ainda, os profissionais defendem a sequencia da escuta. É que os casos são encaminhados para a rede de proteção, formada por técnicos e profissionais, que dentro do possível, atuam como remédio, curando as feridas abertas pelo trauma. Completa o “pacote”, a possibilidade de defesa do acusado, dentro dos requisitos do projeto.

Eles apoiam o projeto

Ao longo deste primeiro ano – e antes também – algumas empresas apoiaram a causa. Elas continuam apoiando a proposta. São elas: Grupo Verde Vale de Comunicação, Girafa, Pormade, Breyer, CDL, Sinal Max, Mário Cartório, União Contabilidade, Sicredi, Moretto Materiais de Construção, arquiteta Daiane Pasa, Qualitá Avaliações Psicológicas, Clinica Bella Vitta, Supermercado Giacomini, Dona Lu Modas e Acessórios e Pizzaria Suprema.