TRAGÉDIA NO INTERIOR: Bernardo Knapik relembra momentos de drama

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Atualizado há 8 anos

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Diante dos olhos: casal continua na casa mas não sabe se morar ali continua sendo boa opção

Visitar a comunidade interiorana de Antônio Cândido, interior de Porto União, é a certeza de uma sensação imensa de incredulidade. O cenário é desolador. Ao longo das propriedades rurais, a maioria dona de plantações de hortaliças e pequenos rebanhos de leite, dezenas de árvores, cortadas ao meio, como se alguém tivesse feito isso com “capricho”, à mão, transformam o cenário. Outras tantas estão caídas, mortas, destruídas.

Algumas casas resistiram, mas nem todas tiveram a mesma sorte. Porém, o desespero que viveram o professor Bernardo Knapik e sua esposa é a sinopse de toda a tragédia. É que a casa da chácara do casal ficou no “olho do furacão”, literalmente. Tudo ao redor, absolutamente tudo, mudou de lugar. E por isso, nada ficou igual ao que a família chama carinhosamente de “a Suíça de Porto União”, uma referência à altitude da comunidade, em incríveis 1060 metros acima do nível do mar. “Um brinquedo que eu chamo de Titanic, que a gente fez só para brincar mesmo, voou para o outro lado”, lembra.

E a tristeza maior foi anunciada poucos minutos após a onda barulhenta de pânico. O chacareiro dos Knapik, Arthur Rubin, de 57 anos, morreu após ficar embaixo do que restou da casinha onde ele e o irmão, Reinaldo, de 54 anos, viviam. Reinaldo, inclusive, segue hospitalizado, rezando por ele, pela alma do irmão e da mãe, que morreu uma semana antes do desastre.

Dois minutos de pânico

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Cerca-viva apareceu como heroína neste episódio real, sem truques

Na região central do Vale do Iguaçu, a chuva que acompanhou o vento forte durou certo tempo, com eventos brandos. No interior, contudo, o fenômeno chamado pelos meteorologistas de micro-explosão, durou apenas dois minutos. Rápido e sorrateiro, ele foi suficiente para assustar os moradores. E muito. É só imaginar o som de galhos quebrando ao meio, árvores sendo arrancadas com raiz, caminhão tombando, casas completamente destruídas. “O barulho era tipo um avião pousando”, lembra.

Conforme ele, tudo começou com uma porta batendo forte, perto das 19h30. A esposa de Bernardo assava pão. Ele, assistia TV. “A porta começou a bater e eu falei: ‘vou apagar a luz geral’. Ela (esposa) pediu pra esperar porque o pão estava no forno. Esperei um pouco. Mas quando cheguei na porta, caiu a luz”, conta. O que mais intrigou o casal, sozinho, naquele impressionante 15 de maio, era o movimento sem vento. Aliás, para o professor, essa é uma das provas de que se tratava realmente de um tornado. “Aquilo era sucção. O tornado estava pegando o ar para se movimentar”, diz. “Fechei a porta. Veio o vento e começou a quebrar os vidros. Minha esposa queria ficar embaixo da mesa. Eu disse: ‘vamos no quarto do fundo que é melhor’. Fomos até lá, fechamos a porta, deitamos e já acalmou. Acalmou totalmente. Com a lanterna, vi que o telhado não existia, já tinha ido tudo embora”, completa.

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Desastre alterou completamente o cenário pacato da comunidade de Antônio Cândido

A crença em um tornado é reforçada aos olhos do professor quando ele olhou com mais atenção para o movimento de queda das árvores. “Algumas caíram para o norte, outras para o sul, leste e oeste. Não para uma direção apenas. Aqui onde está a nossa casa foi o centro do redemoinho e isso foi a nossa sorte, porque o centro não tem tanta força. É o que está fora. Tanto é que o caminho tombou, tanta era a força do vento”, justifica.

Aos poucos, à luz da lanterna, Knapik e a esposa foram descobrindo mais estragos. Iluminaram o terreno e perceberam a fiação elétrica no chão. Um pouco mais a frente, a casa do chacareiro completamente demolida. Ao fundo, um grito de dor e um pedido de socorro: era Reinaldo, sentindo frio e dizendo que não conseguia levantar. Naquele momento, a voz de Arthur já não existia mais. Foram minutos de caos, depois, horas de tristeza e até hoje, dias de muitos porquês sem respostas. “Tivemos sorte, apesar da tragédia. Atribuo isso há três razões: estarmos no centro do tornado, à cerca viva e a touceira de bambu que seguraram muita coisa”, afirma.

A cerca viva e a plantação de bambu são naturais e por serem firmes, impediram que a natureza jogasse para dentro da casa dos professores o que encontrasse pela frente. Foram freios, de fato.

O futuro

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Na sexta-feira, empresas já trabalhavam na recuperação dos postes de iluminação

Knapik tem certeza de que quer continuar morando na chácara. A esposa prefere viver no centro da cidade, onde o casal também tem uma casa. Para o professor de Biologia, que sempre foi ligado aos estudos da natureza, o que se perdeu, com exceção da vida do chacareiro, não foi nada demais. “Tenho sorte por ter uma convivência com os franciscanos e vi que não ter muito é saudável. Perdi, tudo bem, mas para a vida não precisa tanto”, sorri.

Na chácara, Knapik quer continuar com suas pesquisas – a mais famosa é a da produção e uso do pó basalto – e, quem sabe, transformar o espaço em uma pousada. “Para divulgar o lugar e os projetos”, sonha. De qualquer forma, ambos concordam que apenas o tempo, e só ele, definirá seus destinos. Para eles, é cedo demais para responder alguns questionamentos.

Recuperação

Para Knapik, o tempo para recuperação dos estragos feitos na natureza é de 20 anos, pelo menos. “E não totalmente. Tínhamos árvores ali, como a Sapopemba, de 90 anos. Pés de Eucalitpo de 29”, lembra. “A natureza vem e daqui dez, 20 anos, já se tenha de novo uma boa estrutura. Se não acontecer de novo o que aconteceu”, completa.

Efeitos e solidariedade

A casa dos Knapik é apenas uma das residências atingidas. Outras famílias também tiveram prejuízos. Algumas, além do imóvel, perderam animais da criação e parte da plantação. Hoje a Defesa Civil de Porto União divulga um balanço com todos os dados das perdas. Mas, conforme o órgão, as famílias atingidas não precisam de roupas, nem de alimentos. No momento, apenas doações de material de construção são bem-vindas. O Rotary Clube Porto União – União da Vitória, por exemplo, foi um dos grupos doadores. Nesta semana uma carreta, carregada com telhas de amianto (Eternit), será deixada à disposição dos moradores que tiveram suas casas atingidas. Para saber como ajudar, o telefone da Defesa Civil, 3523-7001, foi disponibilizado.