Da pequena “Olivetti” ao Tablet

Dago Alfredo Woehl – Jornalista, membro da ALVI. Foto: Sabrina Brun

Comemorar os 90 anos “do Comércio” trouxe a lembrança dos quase 50 que de uma forma ou outra estivemos juntos.

Saí do jornalismo em 1973, armado com uma maquininha Olivetti Studio 44, comprada na Hermes Macedo a prestação, tendo a mãe como avalista.

Foi um momento importante da minha vida. Ainda tenho imagens claras dos sentimentos de alegria e apreensão daquele dia: primeiro pela “conquista” da compra do bem; segundo, pelo futuro que se abria com aquela “arma”.

Ser jornalista sempre foi meio estressante por causa da urgência em se dar a notícia “encima do fato”; juntar as “letrinhas” e ajeitá-las de forma a que as pessoas entendessem o que a gente estava vendo e ainda por cima, pudessem ter uma leitura instigante e prazerosa.

Me criei jornalista no tempo em que importante mesmo era conhecer o delegado, quem curava doença venérea era o farmacêutico, o teste de gravidez era feito com sapo e quem mandava no Paraná era o Cury.

Da Olivetti ao computador, o jornal “O Comércio” também trilhou o seu caminho. Distingo pelo menos três fases, começando por um período romântico do jornal, com notícias tocadas em ritmo “poesia”, tipo Baile de Debutantes e coluna social, palavras ingênuas massageando egos, enaltecendo feitos meio ridículos. Neste tempo isto fazia parte do jogo da sociedade que amadurecia aos poucos.

Depois, passamos um período “cangalha” onde quase toda a receita para a sobrevivência do jornal, na verdade dos jornais, vinha do poder público. Neste tempo era difícil falar algo que pudesse desagradar um prefeito ou deputado (ele cancelava as verbas de publicidade do governo). O jornal de 90 anos também não passou incólume a estas ondas ou garras do status quo.

Por último, avançando para não ficar para trás, o jornal impresso sofreu uma repaginada, uma mudança no seu layout que o deixou com cara de gente nova, meio que se adaptando aos novos tempos de mensagens curtas, foco. Notícia rápida sobre um número também selecionado de notícias de interesse, deixando ao leitor tempo para “seguir a vida” ou buscar mais detalhes ou complementos ao assunto.

Pessoalmente acho que gostava mais quando se tratavam de grandes temas com notícias ou reportagens que ajudavam a compreender a cidade, acreditar no seu futuro com aquele sentimento de orgulho, de viver aqui, de fazer parte daqui: eu sou de União!

A lembrança alcança o sonho da Da Granja; o planejamento em busca do centro médico/universitário regional (em reuniões no Fórum de Debates realizado na CDL); a silvicultura e piscicultura, o rio Iguaçu e os “segredos” de como conviver com as enchentes; o turismo. Estes dois últimos assuntos aos quais dediquei boa parte da minha vida tem muito a ver com o jornal. Afinal, é o Iguaçu que nos faz diferentes. Uma cidade bela, única. Dar a conhecer o rio, o “ritmo” das cheias, o tempo em que elas podem se repetir em cada canto da cidade facultando a cada um a opção de escolha pelo lugar da sua moradia era tarefa do jornal.

Um trabalho de conscientização permanente capaz de sugerir uma convivência harmônica com o Iguaçu das Cataratas, uma das 7 maravilhas naturais do mundo contemporâneo ao alcance da mão e a sua disposição.

Da pequena Olivetti ao tablet, bem antes da era digital, chegamos a montar um “computador” usando fita cassete, um gravador Crown Corder e mais alguns fios (acho que na fábrica, mas era mais coisa do Coronel Bom e do Roberto). Funcionou, mas aquilo não prendeu minha atenção vez que apresentava limitações.

Na segunda onda tecnológica dos meios de comunicação ainda demorei um pouco para fazer uso do computador. Quando aposentei a Olivetti (está comigo e funcionando até hoje) percebi o descompassado e o tempo perdido. Um dia, apagando uma letra mal colocada fazendo uso de uma borracha (imagine!) percebi o “tamanho” do atraso. Nesta época acho que o jornal era enviado pela Estrela Azul para Curitiba e, se chegasse no horário, era impresso e voltava – também pela BR 476 – no dia seguinte.

Por fim, chegamos juntos ao tempo da era digital. Pela televisão ou quando você abre o celular, é bombardeado por um milhão de informações. Todo mundo é meio jornalista, dá pitaco, mete o pau, é a favor, contra, fala o que quer e tem “seguidores” contados um a um, como troféu. Os meios são poderosos, multiplicam a informação e a disponibilizam na medida do interesse de cada um: YouTube, Instagram, Face, Whats. O arsenal do conhecimento e de informação fica ao alcance de todos, na “nuvem”. O velho Aurélio (pai dos burros) e a Britânica cederam ao Google.  

Antes o jornal dava a notícia ajudando a formar opinião. A vida seguia na interação entre pessoas e a comunidade. Agora a coisa vem de diversas fontes em grande volume tele transportando a vida para a telinha. E as pessoas parecem felizes com isto. Até a satisfação é virtual.

Estes dias, pensando nos 90 anos “do Comércio” impresso, olhei para trás e pensei em dividir com vocês minha alegria por esta sensação de pertencimento. Se hoje ainda “vivo” o jornal, é porque tenho sido constantemente motivado a escrever, instado a participar do espírito de compromisso com o desenvolvimento da cidade. Isto é admirável na gestão do Caique e seus diretores.

Mas tem mais uma coisinha que gostaria de sussurrar no “meu parabéns” a você, jornal: estender o cumprimento de aniversário com um abraço aos leitores de toda a vida, aos colegas “de serviço” e à direção, a nova direção de “O Comércio”, jovem, arrojada, afinada, perspicaz na sua visão estratégica com foco na evolução e no futuro. É que é possível sentir nela o respeito pela história de “O Comércio” e também para conosco, os “velhinhos” do quadro, convocados para comemorar não só a história do jornal, mas também honrar a memória de todos que noticiaram nele a história das cidades.

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