Gratidão aos milhares de heróis da saúde

O mundo silenciou no início da pandemia. Há quase dois anos de enfrentamento da Covid-19 inúmeros relatos reforçam a importância dos profissionais que se doaram no cuidado com o próximo


Eles viraram anjos sem asas e são chamados de heróis sem capa. Um batalhão de profissionais atua na linha de frente de socorro às vítimas da Covid-19 nos hospitais, unidades de pronto atendimento (UPAs) administradas pelas prefeituras e, tantas outras formas para estender a mão ao próximo. Muito embora tivessem medo de se contaminar e de levar a doença para os entes queridos que estavam em casa, não desistiram e seguiram em frente, indo além do cansaço com a demanda, das pressões externas para conferirem a vitória individual de seus paciente ao vencer a doença respiratória, daqueles que puderam voltar para casa e a gratidão em oferecer a assistência às milhares de pessoas que foram infectadas pelo vírus.

Há quase dois anos, o Brasil enfrenta a pandemia do coronavírus. Entre tantos relatos de sobrevivência no período, há de se pensar na gratidão aos verdadeiros heróis, os profissionais da linha de frente, que continuam arriscando suas vidas diariamente.

Segundo o Centro de Estudos Estratégicos (CEE/Fiocruz) são entendidos como profissionais da linha de frente os médicos, enfermeiros, odontólogos, fisioterapeutas e farmacêuticos, todas as categorias profissionais da área da Saúde, inclusive administrador hospitalar, engenheiro (segurança do trabalho, sanitarista) e um expressivo número de residentes e graduandos da área da Saúde.

Uma pesquisa da Fiocruz divulgada em março deste ano revela que a força de trabalho durante a pandemia é majoritariamente feminina (77,6%). A maior parte da equipe é formada por enfermeiros (58,8%), seguida pelos médicos (22,6%), fisioterapeutas (5,7%), odontólogos (5,4%) e farmacêuticos (1,6%), com as demais profissões correspondendo a 5,7%. A faixa etária relativa aos profissionais da linha de frente mais comum é entre 36 e 50 anos (44%).

Trabalhadores jovens, de até 35 anos (38,4%), também possuem grande representatividade na assistência. O levantamento indica, ainda, que 34,5% dos profissionais trabalham em hospitais públicos, 25,7% na atenção primária e 11,2% atuam nos hospitais privados. A maior parte está concentrada nas capitais e regiões metropolitanas (60%).

Intitulada Condições de Trabalho dos Profissionais de Saúde no Contexto da Covid-19, a pesquisa da Fiocruz destaca que em todo o território nacional, a pandemia alterou de modo significativo a vida de 95% desses trabalhadores.


Entre flores e espinhos

Dados da Medicina S/A, a revista de negócios, tecnologia, gestão e liderança do setor médico-hospitalar no Brasil, apontam que até junho deste ano, cerca de 89% dos profissionais de Saúde que atuam na linha de frente do combate à Covid estão psicologicamente cansados. Esse dado foi extraído da pesquisa Pandemia na Linha de Frente, que avaliou as principais dificuldades enfrentadas pelos profissionais da Saúde que atuam no combate à Covid-19.

Entre os dias 29 de março e 05 de abril, foram ouvidos 4.398 profissionais da Saúde de todo o Brasil, sendo que 2.239 afirmaram atuar na linha de frente. Dos profissionais que atuam na linha de frente, 1.013 são médicos, 668 são enfermeiros e 558 são técnicos de enfermagem.

Ainda, a pesquisa Pandemia na Linha de Frente também avaliou o medo dos profissionais da linha de frente com a infecção e transmissão do novo coronavírus. O levantamento aponta que, dos profissionais da linha de frente que já foram diagnosticados positivos para a Covid-19 (41,7%), 87,9% têm medo de se reinfectar. Entre os que ainda não tiveram diagnóstico confirmado para o novo coronavírus (58,3%), 86,1% têm medo de se infectar. O medo de levar o vírus da Covid-19 para dentro de casa é alto: 97,2% dos respondentes afirmam temer infectar familiares com a doença.

O Brasil registrou a morte de 5.798 profissionais de Saúde de março de 2020 até fevereiro de 2021. Trata-se de aumento de 25,9% em relação ao mesmo período de 2019, quando houve 3.571 mortes. A alta é consequência direta dos desafios enfrentados por esses trabalhadores no combate à pandemia. Os dados foram compilados pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil).


REPRESENTANDO TODOS OS PROFISSIONAIS DA SAÚDE, O COMÉRCIO REGISTRA ALGUMAS DAS EXPERIÊNCIAS VIVIDAS ATÉ AGORA COM A PANDEMIA. GOSTARÍAMOS DE INCLUIR TODOS QUE ATUAM NA LINHA DE FRENTE NO VALE DO IGUAÇU. QUE ESTES NOMES ESTENDAM OS APLAUSOS E GRATIDÃO AOS DEMAIS:


PAULA FERNANDA QUAGLIO KRZYZANOWSKI

Diretora da 6ª Regional de União da Vitória (atendimento em nove municípios)

Atuando desde março de 2020 na linha de frente da Covid-19

“Que a história que está sendo escrita através deles (profissionais da Saúde), de suas formações, dedicação e empenho em fazer com que o impacto dessa maior crise sanitária da nossa geração, seja a menor possível para eles mesmos, suas famílias e a sociedade da qual fazem parte”.


VALTER AUGUSTINHO DE OLIVEIRA

Coordenador de Enfermagem No Hospital Regional São Camilo & Centro de Saúde São Camilo

De seus 36 anos, 17 deles dedicados à sua formação

“São dois sentimentos: o primeiro como Valter, pessoa física, é de muito medo. É um medo do desconhecido. É um medo de vir trabalhar e não poder voltar para casa. Agora, como o enfermeiro Valter, a pandemia fortaleceu muito a mossa profissão. Tivemos uma visibilidade nunca presenciada antes.  Sabe, muitas vezes deixamos de cuidar da nossa família para cuidar do próximo, e são pessoas que muitas vezes não conhecemos. O sentimento de ver um paciente saindo do hospital é inexplicável. É inegável que um verdadeiro exército de homens e mulheres tem se mobilizado para atender aos pacientes com sintomas do coronavírus por todo o País. É um vírus que pega facilmente. Então todo cuidado é essencial nesse momento. O medo vem, mas sabemos que estamos cuidando das pessoas”.


ANTONIA BILINSKI

Administradora da APMI, Associação de Proteção à Maternidade e à Infância em União da Vitória

“Desde março de 2020 as condições de trabalho mudaram. A pandemia exigiu grande  esforço concentrado no atendimento às pessoas que precisaram de tratamento hospitalar, vitimadas pela Covid. Várias adequações foram feitas de forma urgente para que o Hospital pudesse oferecer um tratamento adequado e seguro à todas as pessoas. Isso porque as demais patologias continuaram a existir e era necessário oferecer segurança a todos: aos pacientes sintomáticos de Covid, aos pacientes com outras patologias, às pessoas que trabalham no Hospital, sem as quais a estrutura organizacional não funciona. Hoje, expressamos nossa gratidão aos profissionais da linha de frente. Sem o trabalho abnegado dessas pessoas a estrutura não funciona. Cito aqui Médicos, Enfermeiros, Técnicos de Enfermagem, Fisioterapeutas, Serventes, Copeiras, Cozinheiras, Lavadeiras, Pessoal da Administração, Farmácia, Suprimentos e Manutenção, e tantas outras pessoas envolvidas diretamente para que o Hospital pudesse oferecer um atendimento seguro. Destacamos aqui, o abnegado esforço de Aliny Klabunde, Enfermeira, que dedicou todo o seu tempo, todas as suas horas de descanso ou seu lazer para que os fluxos de atendimentos fossem dinamizados e dessa forma atendendo nossos pacientes com segurança e zelo. Essas pessoas são guerreiras, são fortes. São elas que fazem o atendimento acontecer, são essas pessoas que fizeram e ainda fazem a diferença na vida de cada paciente atendido na APMI”.


LETÍCIA LUCIANE KORBUS

48 anos, 18 deles dedicados à sua formação. Enfermeira com especialização em terapia intensiva e emergência

Atua há 14 anos no Hospital São Braz de Porto União

“Nesses meses em que vivemos está pandemia foram os piores meses da minha profissional, porque vivenciei muitos momentos tristes, pessoas entrando, conversando pela porta da UTI e saindo sem vida. Desespero das famílias, tristeza e comoção da equipe. Mas ao mesmo tempo, cito a gratidão e a emoção por aqueles que se recuperavam e saíram bem. Apesar de tudo isso que vivemos, eu sinto uma gratidão enorme por fazer parte desta classe de profissionais que cuida da saúde com profissionalismo dedicação e amor”.


LARISSA K. ZABOROVSKI

Gerente de Enfermagem no Hospital São Braz de Porto União

26 anos. Há três anos atua no São Braz e desses, um ano e oito meses na linha de frente da Covid

“A pandemia foi avassaladora, trouxe com ela dias tristes, cansativos, dias em que éramos consolo e dias em que éramos consolados. Assim como muitos, também perdemos familiares/amigos para a Covid-19 e no trabalho fazíamos mais do que o possível para conseguirmos presenciar aquele paciente indo para a sua casa com vida, pois acima de tudo ele era o amor, o pai, a mãe ou o filho de alguém. Mas, por outro lado também nos trouxe a  alegria e a emoção quando juntamente com toda a equipe conseguíamos acompanhar o paciente até a saída do hospital e ouvir ele comemorar dizendo ‘EU VENCI A COVID’, era um misto de sensações que não tem como explicar e o que era mais gratificante, era os agradecimentos do paciente, da família, que vinha em forma de um ‘muito obrigado por cuidarem de mim’ ou ‘obrigada por cuidarem da minha mãe’ ou até mesmo um sorriso de ‘orelha a orelha’ e não precisava dizer mais nada. Não foram dias fáceis, mas todos continuaram firmes nessa batalha, lutando juntos pela vida e recuperação dos pacientes, cumprindo o nosso juramento e fazendo o que escolhemos fazer que é CUIDAR DO PRÓXIMO!”



CARLOS EDUARDO MOURA

66 anos, médico anestesista, com atuação na linha de frente da Covid-19 na APMI de União da Vitória

“Não sou nenhum herói. Da linha de frente estive na condição de paciente. Senti na pele a sensação de ser diagnosticado com a Covid-19. Não sou nenhum herói, mas sim um sobrevivente da Covid-19. Em janeiro deste ano, o médico apresentou os primeiros sintomas da doença. Lembro que faltavam dois dias para que o pessoal de Saúde no Vale do Iguaçu fosse vacinado contra a Covid. Eu comecei a sentir umas ferroadas pelo corpo e calafrios, algo similar com um quadro de gripe inicial. Me senti mal e pensei: deve ser Covid! Coletei o exame e já realizei uma tomografia. Os sintomas evoluíram. Fiquei três dias em casa e a partir de então não tenho mais lembrança dos fatos que se sucederam. Minha família conta que eu estava conversando normalmente, mas disso eu não lembro. Na tomografia o diagnóstico foi de comprometimento pulmonar. Após isso, fiquei mais uns quatro dias internado na ala Covid. Os colegas médicos da APMI entenderam por bem e pela evolução da doença que eu fosse transferido para a UTI. Neste dia já solicitei que eu fosse intubado, pois estava com dificuldade em respirar. Após a sedação, não lembro de mais nada. Foram 55 dias internado na UTI, destes 35 dias intubado. Em todo esse período a minha cabeça não parava de funcionar, ou seja, sensação de inúmeros pensamentos a todo o momento. A cabeça não para, não para e não para. Certo dia, acordei como se eu estivesse nos Estados Unidos, trabalhando lá, em uma ala da Covid. Em outra ocasião, acordei como se estivesse em uma unidade de tratamento, em uma espécie de cúpula e que ficava à beira mar. Eu estava com dificuldade respiratória e dizia: estou aqui, longe de tudo e não sei como vim parar aqui; preciso avisar as minhas pessoas queridas e não tenho celular aqui. Sentia muita angústia. Ainda não se conhece muito sobre as características da doença, o que é mais difícil tratar. É preciso ser otimista e ter esperança. O mundo inteiro ainda está descobrindo a Covid e para cada pessoa o comportamento da doença é diferente. Tem pessoas com oitenta e tantos anos e com comorbidades que superam a doença; por outro lado, jovens que são acometidos por ela. Não tem um parâmetro. Trabalho por anos lidando com a vida e com a morte, mas aprendi que a família e as amizades são as nossas maiores riquezas”.


ÉRICA RIBAS DE CARVALHO

40 anos, farmacêutica, Chefe da Divisão de Vigilância em Saúde da 6ª Regional de Saúde de União da Vitória

Linha de frente da Covid desde março de 2020

“Estamos em uma fase bastante positiva no combate a Covid. Esse segundo semestre de 2021 vem apresentando uma queda bastante importante no número de casos, internamentos e óbitos pela doença. A adesão da população a Campanha Nacional de Vacinação contra a Covid-19 é uma das principais causas desses bons resultados. Porém, ainda não podemos considerar o fim da crise sanitária, a Pandemia ainda faz parte da nossa realidade, não devemos relaxar nas medidas de higiene e prevenção, no uso de máscaras e principalmente a população deve estar consciente da busca pelo esquema completo de vacinação”.


ANGELA MARIA BRZEZINSKI

39 anos

Enfermeira da 6ª Regional de Saúde de União da Vitória

“Nesta guerra, sendo uma das piores pandemias vividas pela humanidade, sofremos muitas perdas e momentos de tristeza. Exigiu do gigante Sistema Único de Saúde – SUS, agilidade, organização e superação. Vimos que as fragilidades e dificuldades crônicas que o sistema apresenta precisam de olhar e atenção. Mas também temos muito do que nos orgulharmos; nossos profissionais não mediram esforços, foram incansáveis no enfrentamento desta doença, se reinventaram e superaram-se. E continuam, fortalecidos, seguindo em frente”.

 

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