Opinião: “Depois da Paulista…”

A grande questão da política nacional, atualmente, é a configuração de forças após a manifestação de 25 de janeiro. Claro, o êxito do evento pode alterar o rumo da prosa, mas é inquestionável que o tabuleiro político, além de vários outros fatores, sofrerá alterações significativas à frente. É inegável que Bolsonaro fecha o seu time e se coloca como um eleitor poderoso ainda que longe das urnas.

Depois da Paulista…

Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil

O grande mérito de Bolsonaro, no jogo político, é exatamente colocar a direita na vitrine. Durante quatro ou cinco décadas, ser da esquerda era se associar à vanguarda cultural, estar ao lado dos ícones da música e assumir uma personalidade liberal, algumas vezes quase “cult’, em plena era de evolução tecnológica da humanidade, se associar aos novos tempos. Ser de direita era ser “careta”, quase discriminado pela postura conservadora em plena revolução cultural. Talvez afirmar que as pessoas tinham vergonha de ser de direita descreva melhor, mas, com a pauta de costumes, majoritária na sociedade brasileira, como bandeira, desde 2018, a sociedade mudou seu juízo de valores e, atualmente, afirmo com convicção que a direita é amplamente majoritária, embora, também incontestável, Bolsonaro, seu principal ícone, é bem menor por conta de seus excessos e contradições.

Lula 3 é fruto muito mais dos erros e excessos de Bolsonaro e da Lava Jato do que de seus méritos, sempre tendo a coerência de não os negar. Todo e qualquer candidato à reeleição no Brasil, em qualquer nível do executivo, é favorito e, para perder, precisa errar. Se o cargo for a presidência, precisa insistir no direito de errar e Bolsonaro fez isto, pouco importa avaliar o mérito de suas pregações ou mesmo suas intenções golpistas, ou de seus auxiliares.

Também fugindo da análise do mérito, as trapalhadas, ou pedaladas, de Dilma minaram os alicerces do império petista e nisto resultou Bolsonaro. Neste jogo de múltiplos erros, segue a política nacional, inflada de siglas raquíticas de ideologia e obesas de interesses, que impede disputas ideológicas e consagra o personalismo, uma espécie de caudilhismo tupiniquim, onde lideranças eivadas de deficiências, como Lula e Bolsonaro, disputam a alma e o coração de sete em cada dez brasileiros, onde eleitores se agridem para decidir quem terá o direito de se ajoelhar aos pés do congressista que comanda o centrão, entidade mística, suprapartidária que, sem nenhum artigo constitucional a sustentar, dá as cartas do jogo de poder e cobra um “buy in” cada vez maior dos incautos.

Todavia, ainda que um ou outro campeonato tenha final diferente, o grande fla x flu da política nacional ainda é Lula x Bolsonaro e assim será até que Tarcísio vista o uniforme e entre em campo, ou alguém com potencial equivalente, porque no campo da esquerda o titular só sai de campo se abatido por fadiga incurável.

Por conta disto, resta observar que o time de Bolsonaro mandou muito bem no jogo de hoje na Paulista, nada que defina o campeonato, mas com potencial para inflar a torcida para a próxima disputa. De novo e mais uma vez, o jogo principal será disputado nos tribunais, onde Bolsonaro pode receber cartão vermelho, não importa se jogando bem ou mesmo fazendo gols no adversário.

Foi apenas um amistoso, não altera em nada a situação de Bolsonaro na Justiça, onde outra data, o 8 de janeiro, tem potencial para lhe tirar o sono por longos quatro ou oito anos. Todavia, sobe a temperatura e, de novo, pelo personalismo exacerbado de ambas as lideranças principais, seguimos longe da pauta realmente importante. Nada de economia, desenvolvimento, projetos ou fatos relevantes porque só a espaço para a intransigência de nosso líderes e a população segue beligerante, embalada pelo ledo engano de que os mitos da ponta da régua ideológica sejam capazes de superar nossas mazelas por toque de Midas.

Olhando para a cena eleitoral, a direita aumenta seu cacife para as eleições municipais, fato restrito aos grandes centros onde as questões nacionais te alguma relevância, e, ainda assim dependendo dos fatos econômicos porque estes serão sempre a principal motivação eleitoral. É sempre bom lembrar que a paixão bate forte no coração, mas o bolso direciona a mão na escolha das teclas da urna eletrônica.

A vida nacional segue, o ódio volta a pulsar nas veias dos iludidos, a polarização continuará a fazer estrago e continuaremos a assistir impotentes a eterna disputa de ego que nada tem a ver com o necessário debate da Nação em direção ao desenvolvimento e ao enfrentamento de nossas limitações simplesmente porque setenta por cento dos brasileiros continua acreditando em salvador da Pátria.

8 de janeiro, 25 de fevereiro ou qualquer outra data, ainda que seja o dia das eleições não vão alterar a vida nacional.

O verdadeiro desejo das elites é a construção de um clima que permita uma anistia ampla, mantendo os mesmos personagens no palco, ainda que, eventualmente, o enredo sofra pequenos ajustes. Aliás, a mesma construção que permitirá zerar a conta da corrupção, devolvendo à cena velhos personagens e patrocinadores do grande teatro político brasileiro, onde a plateia paga o ingresso, paga a produção, os salários e ainda se apaixona pelos atores, sejam mocinhos ou bandidos.

Basta de heróis nacionais, a grande batalha precisa ser vencida pelos heróis anônimos que sobrevivem ao modelo nefasto que lhes toma 35% dos ganhos, devolve muito pouco e guarda nacos generosos para a elite que briga nos palanques e se confraterniza nos bastidores.

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