Opinião: “O que nosso congresso faz por nossas liberdades?”

Tenho denunciado frequentemente a existência de um progressivo esvaziamento de nossas liberdades de expressão no país. Algo grave, sobretudo por ter como consequência uma também gradativa insensibilidade das novas gerações em relação à perda de tais valores.

Isso não é obra de um vilão só. Não é certo culpar apenas alguém, um grupo ou um dos Poderes da República pelo caos de nossas liberdades. O Judiciário tem recebido a maior carga de críticas, por ser um poder muito atuante e viver debaixo de holofotes o tempo todo, mas o Executivo também é personagem relevante nesse processo, e não é de hoje.

Um exemplo: o governo Lula mal tomou posse, instalou na Advocacia Geral da União (AGU) uma procuradoria especial que pode ser (mal) usada com a finalidade de processar dissidentes. Vale lembrar que esta mesma AGU foi utilizada por Bolsonaro para processar veículos de imprensa, chegando até mesmo a uma ridícula tentativa de obter o direito de substituir uma capa da revista IstoÉ por uma outra chapa branca.

Quanto ao Legislativo, sua responsabilidade pelo caos de nossas liberdades tem sido omissiva e, por isso, talvez, a mais grave, pois silenciosa. Sua passividade, nos últimos anos, tem sido decisiva para que os demais poderes avancem sobre as liberdades individuais. O sistema de freios e contrapesos de nossa República deveria funcionar de forma tal que o abuso de um dos poderes pudesse – e devesse – ser contido pelos demais. Se Judiciário e Executivo têm agido muitas vezes de forma censória, a passividade do parlamento é uma porta aberta, no lugar de ser um obstáculo, como deveria.

A maioria dos casos de censura promovidos pelo Executivo é resultado de decretos e portarias feitos sob justificativa de que o Congresso é lento. O Judiciário tem na raiz de seu ativismo judicial a omissão do Legislativo no enfrentamento de temas importantes. O Congresso faz leis, debate com a sociedade, as depura. Quando as leis não são feitas – ou são mal feitas –, quando o debate não ocorre de forma suficiente, o Congresso abre brechas para que Executivo e Judiciário supram a omissão legislativa, de forma precipitada, sem ouvir ninguém e com base em interpretações que não foram dialogadas com a sociedade.

A afobação do Executivo e a subjetividade do Judiciário em enfrentar temas relativos às liberdades de expressão são das principais causas das restrições irregulares às liberdades de expressão no Brasil, e consequência direta da passividade do Congresso. Eu não teria muita dificuldade em afirmar que nossas liberdades estão cada vez mais se estrangulando em razão do Congresso não assumir suas funções de fazer leis, discutir com a sociedade e barrar condutas inconstitucionais dos demais poderes.

Um Legislativo forte, um legislador capaz, sem dúvida alguma são das soluções possíveis aos problemas que o brasileiro tem tido com o exercício de suas liberdades, em especial a de expressão.

Entre extremistas que atacam o Estado e extremistas que respondem aos ataques em nome do Estado, vozes moderadas fazem uma tremenda de uma falta no Congresso. Mas, ao menos por enquanto, das Casas do povo o que temos são apenas silêncio e receio. Vejamos o que vem pela frente.

André Marsiglia, advogado constitucionalista e membro da Comissão de Liberdade de Imprensa da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – SP e da Comissão de Mídia e Entretenimento do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP)

Voltar para matérias