Como lidar com a depressão, transtorno considerado a doença do século

O Brasil é o país com maior prevalência de depressão na América Latina, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). De acordo com o Ministério da Saúde, estima-se que 15,5% da população brasileira sofrerá com a doença em algum momento da vida. Por vezes incapacitante, a depressão tem se mostrado um problema de saúde pública e deve ser, até 2030, a maior causa de incapacitação a nível mundial, sendo considerada a doença do século.

Como lidar com a depressão, transtorno considerado a doença do século

A depressão é caracterizada por uma junção de fatores e traz sintomas que vão muito além da tristeza, como a perda de interesse por coisas que antes eram prazerosas, alteração no sono e no apetite, fadiga e cansaço, sentimento de culpa, dificuldade de concentração, diminuição da libido e, em alguns casos, pensamentos suicidas. As causas desse transtorno mental estão ligadas a questões biológicas, psicológicas e sociais. Fatores genéticos também podem desencadear a depressão, além dos hormonais, vivenciados principalmente pelas mulheres, como os causados pela gravidez e pela menopausa.

Mas como saber que o que se está sentindo não é uma tristeza normal? Segundo a neuropsicanalista Carina Wahl de Almeida, a tarefa pode ser desafiadora e, por isso, é importante estar atento aos demais sintomas. “A tristeza, como uma emoção natural, é temporária. Ela vem em respostas a situações específicas. Situações de tristeza, uma perda, uma decepção, uma adversidade. Ela tende a diminuir ou ela se acaba completamente. Ela é temporária. Já a depressão envolve uma tristeza bem persistente, que dura a maior parte do dia, quase todos os dias. Se nós temos uma tristeza sem motivo aparente, umas duas vezes por semana, nós já precisamos estar atentos a isso. Os sentimentos depressivos não necessariamente estão ligados a eventos específicos, ou seja, é uma tristeza sem um motivo aparente”, explica.

Carina Wahl de Almeida

O quanto a tristeza interfere no cotidiano também é um indicador de que alguém possa estar sofrendo com a depressão. Além disso, mudanças no comportamento, oscilação frequente de humor e sintomas físicos como dor de cabeça frequentes e sem razão aparente e problemas gastrointestinais são sinais de alerta. “Dentro dessa gama de situações que acontecem dentro da depressão, nós precisamos entender que cada indivíduo vai reagir de uma maneira diferente. Às vezes você vê uma pessoa que está tendo um comportamento diferente do normal dela. Ela é uma pessoa mais reservada e, de repente, ela está super extrovertida do nada. Isso também pode ser um sinal de alerta. Por que ela está tendo esse tipo de comportamento? É um comportamento mascarado, é um comportamento forçado”, aponta Carina.

Contudo, por ser uma experiência única para cada indivíduo, é importante fugir do estigma de que uma pessoa com depressão nunca dispõe de momentos de felicidade. “As pessoas têm muito a ideia de que a pessoa depressiva está numa cama chorando, que ela não para de chorar e que ela está sempre triste, e não é assim que acontece. Realmente esse é um estigma de que a depressão está totalmente ligada à tristeza. O paciente com depressão nem sempre está triste. É uma ideia bastante equivocada. A depressão é uma condição muito complexa, que envolve uma gama de emoções, de pensamentos e de comportamentos, e que não se limita só a essa tristeza constante. É muito importante a gente desmistificar esse entendimento e entender que as pessoas com depressão podem vivenciar uma variedade de estados emocionais, inclusive alegria. Embora isso possa ser bastante desafiador para a pessoa com depressão, mas ela pode, sim, ter momentos de alegria”, reforça a neuropsicanalista.


Quando procurar ajuda?

Carina indica que o auxílio médico deve ser buscado quando o indivíduo perceber mudanças em seu próprio comportamento, principalmente alterações frequentes de humor, mais de duas vezes na semana, sem motivo aparente. Neste caso, o indicado é a realização de exames para descobrir se as mudanças são decorrentes de uma queda hormonal, neuroquímica e de vitaminas, ou se realmente se trata do início de uma depressão.

Uma vez diagnosticada a doença, os amigos e familiares assumem um papel crucial no tratamento. Carina aponta que antes de tudo é preciso que as pessoas próximas de um indivíduo com depressão compreendam a doença. “Essa empatia é fundamental. E sem o julgamento, para poder minimizar a dor que essa pessoa está sentindo. Oferecer esse apoio emocional, que não é apenas forçar a pessoa a fazer algo. É importante também incentivar a buscar ajuda profissional”.

O diálogo também é lembrado por Carina como fator importante na ajuda a uma pessoa com depressão. No Vale do Iguaçu, o União Pró-vida oferece apoio a pessoas com idealização suicida, permitindo que essas pessoas desabafem seus sentimentos. Para tanto, voluntários passam por treinamentos que os permitam ser um bom ouvinte. “O atendimento é feito de forma gratuita e sigilosa por meio de uma conversa informal por meio de atendimento presencial. Lembro que não é necessário que a pessoa diga seu nome, idade, profissão, local de trabalho, endereço, ou mostre sua foto no WhatsApp, ou seja, não é obrigatório que a pessoa se identifique na chamada telefônica, pelo WhatsApp e ou atendimento presencial”, relata Érico Silva, voluntário do projeto.

“Saber ouvir é uma arte”. É nisso que acredita o também voluntário do União Pró-vida e cabo do Corpo de Bombeiros de Porto União, Alfonso Eckel. Como membro da corporação, não são poucas as vezes que Eckel precisa atender pessoas que sofrem com a depressão. No momento do atendimento, o cabo acredita que estar atento ao que o outro tem a dizer é de extrema importância. “Se você perceber que uma pessoa realmente está precisando, dê atenção a ela. Nem que seja um minuto, dois minutos. Esse tempo que você deu essa atenção para ela já vai fazer uma grande diferença”, indica.

Eckel tem observado aumento nos casos de ocorrências relacionadas à saúde mental que acabam envolvendo um atendimento por parte do Corpo de Bombeiros. “A gente é chamado praticamente todo dia. Sempre tem alguma ocorrência relacionada com pessoas com algum tipo de transtorno e que precisam realmente ser acolhidas, ser atendidas de uma forma humanizada, respeitando a sua dor, porque a dor que ela está sentindo, essa dor, é dela. Só ela tem a capacidade de medir e saber o quanto que ela está sentindo dor”.

como lidar com a depressão

Alfonso Eckel

Quando o Corpo de Bombeiros é acionado, a abordagem é humanizada, respeitando os limites da pessoa que necessita de atendimento, buscando ganhar a confiança do indivíduo. “Quando ela é acolhida num trabalho humanizado, fica mais fácil para ela conseguir se recuperar posteriormente. Geralmente essas pessoas estão fazendo um trabalho de tratamento psiquiátrico, tratamento psicológico. E se ela receber uma abordagem mais humanizada, é uma grande tendência delas voltarem ao tratamento, que esse é o objetivo, voltar ao tratamento, buscar ajuda”, comenta Eckel.


Depressão tem cura?

Com acompanhamento correto, a depressão é tratável, e o indivíduo pode ter uma recuperação significativa e, em alguns casos, completa, Carina. “O tratamento da depressão também é uma combinação de vários aspectos. Acompanhamento biológico, psicológico, situações sociais, condição social, é um trabalho multidisciplinar. É importante trabalhar sim com a interação medicamentosa, acompanhamento médico. É extremamente importante trabalhar dentro de um processo terapêutico. A medicação vai trabalhar os sintomas dessa depressão, mas ela não vai trabalhar a causa. A terapia vai trazer esse tratamento dentro do entendimento que levou a pessoa a essa doença. Ações complementares que nós podemos trazer, terapias alternativas, atividades físicas, acupuntura, meditação, tudo isso ajuda no tratamento. O suporte social, os amigos e os familiares, o grupo de apoio é fundamental no processo e na recuperação. E também a mudança no estilo de vida. Uma alimentação mais equilibrada, hábitos saudáveis, a prática da atividade física, um sono adequado, tudo isso ajuda no tratamento da depressão e ela tem cura sim. A gente precisa só entender que pode levar um tempo e isso acontece de maneira individualizada. Tem alguns desafios no caminho, mas existe a cura”.


União Pró-vida

O atendimento no União Pró-Vida é feita de forma anônima, pessoalmente no posto de atendimento localizado na Rodoviária de Porto União, pelo telefone fixo (42) 3523-7217, ou pelo WhatsApp (42)98815-6081 e WhatsApp 24h (42)98890-0279.

Pessoas com mais de 18 anos podem realizar Curso de Capacitação de Voluntários que ocorrem nos meses de abril e outubro (inscrições em março e setembro), visando serem plantonistas ou não do UPV. As inscrições podem ser feitas nos telefones (42) 98815-6081 ou (42) 98890-0279, informando nome completo, email, idade, telefone e whatsapp de contato.

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