Mãe relata sua rotina com filho diagnosticado com epilepsia

13 anos após o nascimento de Jéssica, Jaqueline Waltrik Rogal comemorou também a chegada do seu segundo filho, Leonardo. A empolgação foi grande. O desejo em conceber um menino só aumentou após a perda do primogênito de Jaqueline. Já com uma maturidade maternal por conta da filha, ela foi concentrando forças – mesmo sem perceber – para o que viria pela frente.

A moradora de Porto União, após o diagnóstico de epilepsia do filho, vem buscando ensinar outros familiares sobre como cultivar a resiliência e a persistência dos pacientes nesta condição. No caso dela, a doença do filho veio a tona quando ele tinha seis meses de vida. Desde então, Jaqueline veste roxo como forma de mostrar à sociedade que a empatia com os epiléticos é tão importante quanto o tratamento.

Leonardo é chamado carinhosamente de Leo. Atualmente com os seus nove anos ele é conhecido como o príncipe da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de Porto União, escola a qual estuda atualmente. “O Leo teve uma crise de hipoglicemia no nascimento (quando o recém-nascido apresenta concentrações baixas de glicose no sangue até 72 horas após o nascimento). Recordo que ele se desenvolveu bem até os seus seis meses. Foi então que percebemos que passou a ficar molinho e com perda do tônus muscular. Fizemos vários exames até a descoberta da condição epilética. O Leo passou a tomar anticonvulsivantes”.

Sem casos de epilepsia na família, Jaqueline revela que o início do diagnóstico não foi fácil. “Éramos leigos no assunto, porém corremos atrás. Nós não ficamos esperando de braços cruzados. Fomos entendendo a condição do Leo e nos adaptando”, diz.

Jaqueline conta que o Leo, ainda bebê, passou a apresentar crises de ausência, que é um tipo de convulsão que envolve breves lapsos repentinos de atenção. “Era como se o Leo saísse do ar, sabe como? Passávamos a mão em frente ao rosto dele e nada, nenhuma reação. Além disso o Leo vomitava bastante e era como se o corpo dele ficasse enrudecido. Foi então que iniciaram as convulsões”.

Conforme orientação do neurologista do Leo, Jaqueline passou a anotar as convulsões do filho. Até os sete anos de idade as crises passavam de 80. “Era assustador. O médico precisa saber de tudo para que o remédio contasse com a dosagem correta e posterior eficácia para o tratamento. Foi então que o Leo passou a ter 30 crises diárias e depois dez. O Leo é um guerreiro desde que nasceu. Ele luta pela vida. A força dele é um sinal de que eu não posso fraquejar”.

Jaqueline buscou informações e ainda estuda a epilepsia. Segundo ela é um assunto inesgotado. De acordo com ela existem várias alternativas para o controle da epilepsia como dieta cetogênica. Neste caso sendo uma opção de tratamento para crianças ou adultos com epilepsia cujas convulsões não são controladas com medicamentos.

No entanto, a dieta cetogênica ainda não foi testada no Leo. A família optou pelo Sistema RNS, aprovado pela Food and Drug Administration (FDA, órgão regulamentador nos Esta dos Unidos). “É um dispositivo que possui o objetivo de reduzir ataques epilépticos e tende a melhorar a vida do paciente. É como um marca-passo cerebral desenvolvido para tratar casos de epilepsia resistentes a remédios. O procedimento no Leo foi realizado em Curitiba. Implantado no crânio, o aparelho analisa a atividade elétrica do cérebro, identificando padrões anormais ligados a crises epiléticas e impedindo as convulsões”, explica.

O RNS System, produzido pela empresa americana Neuropace, faz parte de uma nova geração de neuroestimuladores inteligentes. A estimulação elétrica cerebral não é novidade no controle de doenças, tendo um aparelho similar já usado para tratar mal de Parkinson.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que cerca de 50 milhões de pessoas sofram de epilepsia no mundo; destas, entre 20% e 30% possuem epilepsia crônica resistente a medicamentos. “O Leo apresenta crises generalizadas. É como se fosse uma geladeira em curto circuito 24 horas por dia. Vale dizer que a epilepsia é uma doença neurológica e não contagiosa”, relata a mãe.

Jaqueline lembra que vários médicos explanaram à ela também sobre o uso da cannabis medicinal na epilepsia de difícil controle. “Ainda não estou preparada para inserir o cannabidiol na rotina do meu filho. No entanto, o RNS, juntamente com outros três medicamentos, estão estabilizando as crises diárias. O organismo do Leo apresenta efeito rebote diante de novos medicamentos e é por isso que eu procuro evitar”.


“Estamos falando da vida do meu filho”

A epilepsia é uma doença neurológica caracterizada por descargas elétricas anormais e excessivas no cérebro, que são recorrentes e geram as crises epilépticas. Para considerar que uma pessoa tem epilepsia, ela deverá ter repetição de suas crises epilépticas. A maneira melhor de traduzir a doença é dizer que se trata de um curto-circuito cerebral. “Muitos podem pensar que quando o Leo dorme ele está relaxado, mas não! Ele também têm crises e a gente não percebe. Durante uma crise severa não podemos demorar no atendimento”.

Jaqueline explica que a família temia o pior e vigiava o Leo 24 horas por dia pelo medo da Sudep (Sudden Unexpected Death in Epilepsy), que significa a morte do paciente durante uma crise epiléptica. “Atualmente estamos mais seguros com relação ao tratamento dele. A visita frequente em especialistas e a aplicabilidade dos tratamentos na vida do Leo tem sido significativa. No entanto, como estamos falando da vida do meu filho, eu tenho dito aos médicos de que ele não é cobaia de ninguém. O tratamento utilizado nele deve ser muito bem analisado e com aval da família ”.

Jaqueline e Leo são cúmplices de uma vida desde o útero. “A lesão acometida no cérebro do Leo, ainda bebê, foi muito severa, pois afetou a visão, a locomoção e a fala. É uma lesão irreversível, mas que não destruiu os neurônios dele por completo. Por conta disso buscamos atendimento com psicólogos, profissionais na Apae e estímulo visual com terapias em Curitiba, além de fisioterapia e hidroginástica. A intenção é que o cérebro dele seja estimulado. Segundo os médicos, pela sequela que o Leo teve, era para ele hoje estar vegetando; porém, com a graça de Deus, ele está estabilizado, sem piora no quadro clínico”.


Purple Day

O Dia Roxo (Purple Day) é um esforço internacional dedicado a aumentar a consciência sobre a epilepsia em todo o mundo. Em 26 de março, anualmente, as pessoas em países de todo o mundo estão convidadas a vestir-se de roxo nos eventos em prol da consciência da epilepsia.

Mãe relata sua rotina com filho diagnosticado com epilepsia

A iniciativa surgiu em 2008, no Canadá, inspirada no relato de uma criança chamada Cassidy Megan, ao compartilhar seu sentimento de solidão por ter epilepsia. A cor roxa foi escolhida em alusão às lavandas, por ser uma flor ligada ao sentimento de isolamento descrito por Cassidy. O objetivo original da campanha era incentivar o diálogo sobre epilepsia, em um esforço comum para reduzir os mitos e fazer com que as pessoas com epilepsia não se sentissem sozinhas.

A campanha no Vale do Iguaçu foi motivada por profissionais da saúde e da Apae. Segundo a diretora da Instituição em Porto União, Lorena Scheffer Redolfi, todas as pessoas estão convidadas a participar da campanha em prol da consciência da epilepsia. “O preconceito com a epilepsia deve acabar e as campanhas estão aí para reforçar isso”.

Lorena conta que, até então, somente os mais íntimos sabiam que ela também é epilética. “Este é o momento para eu contar a minha experiência sobre o assunto. Também sou epilética e atualmente tenho uma vida normal. “As crises apareceram quando eu tinha dois anos de idade. O tratamento para a epilepsia foi contínuo até os 18 anos. No entanto, do contrário da Jaqueline (mãe do Leo), a minha família sabia lidar com a condição, pois minha mãe e meus irmãos também são epiléticos. O tratamento na época era diferenciado, não dispúnhamos de tanta tecnologia como hoje. O meu cérebro também foi atingido, porém fui estimulada ainda na infância e adolescência que as pessoas nem notam as reações do meu corpo, pois quando estou nervosa geralmente tenho paralisia nos braços, amortecimento na língua, porém eu consigo controlar”.

Atualmente Lorena não necessita de medicamentos para o controle da epilepsia. “Tenho uma sobrinha que vem apresentando sinais de epilepsia aos seis anos de idade. Ainda estamos no aguardo do diagnóstico do médico”, disse.


Diagnóstico 

Na maioria dos casos, o diagnóstico pode ser feito clinicamente por meio de um exame físico geral, com ênfase nas áreas neurológica e psiquiátrica e de um histórico detalhado pelo paciente. Muitas vezes, o auxílio de uma testemunha ocular é importante para que a crise seja descrita em detalhes. A ocorrência de uma aura (manifestação sensorial inicial de uma crise), bem como fatores precipitantes da crise, deve ser registrada. Idade de início, frequência de ocorrência das crises e intervalos entre as crises (o mais curto e o mais longo obtido na história do paciente) devem ser caracterizados, muitas vezes com o auxílio de um diário de crises.


Tipos de exames para saber se é epilepsia

Eletroencefalograma, tomografia axial computorizada  (TAC) cranioencefálica ou a ressonância magnética.


Tratamento de epilepsia

No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece tratamento integral e gratuito para os casos de epilepsia, desde diagnóstico até o acompanhamento e tratamento necessários, inclusive o medicamentoso. O tratamento inicia, preferencialmente, na atenção primária, por meio de uma das Unidades Básicas de Saúde espalhadas por todo o País.

Atualmente existem 29 estabelecimentos habilitados na alta complexidade em Neurologia/Neurocirurgia com o serviço/classificação – Investigação e Cirurgia de Epilepsia no Brasil, que deverão oferecer todo o atendimento (média e alta complexidade) necessário ao paciente neurológico, abrangendo de consultas, exames (média e alta complexidade), diagnóstico, tratamento (clínico e cirúrgico), acompanhamento, UTI, entre outros.

Fonte: Ministério da Saúde /Associação Brasileira de Epilepsia (ABE).


Primeiros socorros

Em muitos casos, as crises epiléticas não são previsíveis e as pessoas precisam de apoio, principalmente para não se machucarem durante as convulsões;

  • Mantenha a calma e tranquilize as pessoas ao seu redor;
  • Evite que a pessoa caia bruscamente ao chão;
  • Tente colocar a pessoa deitada de costas, em lugar confortável e seguro, com a cabeça protegida;
  • Nunca segure a pessoa nem impeça seus movimentos (deixe-a debater-se);
  • Retire objetos próximos que possam machucar;
  • Mantenha-a deitada de barriga para cima, mas com a cabeça voltada para o lado, evitando que ela se sufoque com a própria saliva;
  • Afrouxe as roupas, se necessário;
  • Se for possível, levante o queixo para facilitar a passagem de ar;
  • Não tente introduzir objetos na boca do paciente durante as convulsões;
  • Não dê tapas;
  • Não jogue água sobre ela e nem ofereça nada para ela cheirar;
  • Verifique se existe pulseira, medalha ou outra identificação médica de emergência que possa sugerir a causa da convulsão;
  • Permaneça ao lado da pessoa até que ela recupere a consciência;
  • Se a crise convulsiva durar mais que 5 minutos sem sinais de melhora, peça ajuda médica;
  • Quando a crise passar, deixe a pessoa descansar.

Fonte: Ministério da Saúde

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