“Talvez não tenha me dedicado tanto a gestão política”, diz Moisés

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Atualizado há 4 anos

Carlos Moisés. (Foto: Luís Debias).
Carlos Moisés. (Foto: Luís Debias).

O governador catarinense Carlos Moisés (PSL) é o primeiro chefe de Executivo estadual afastado para responder a um processo de impeachment desde a Constituição de 88. O coronel da reserva do Bombeiro que colocou o nome à disposição do então partido de Bolsonaro apenas para preencher tabela foi do céu ao inferno em dois anos.

Em outubro de 2018, eleito com 72% dos votos em uma eleição tida como improvável, Moisés tinha o melhor dos mundos para fazer um governo sem grandes dificuldades. Mas o mundo dá voltas, e na política não basta ser bem-intencionado, é preciso habilidade.

E Moisés ‘ousou’ desafiar as forças mais poderosas do Estado, tentando imprimir um novo jogo no tabuleiro da política catarinense. Aos poucos, foi perdendo todos seus peões, ficou sem base na Alesc, e depois, o mais importante, a popularidade do eleitor.

Em outubro de 2020 Moisés chegou no seu inferno astral como governador. O Tribunal Especial de Julgamento decidiu afastá-lo do cargo para responder ao processo de crime de responsabilidade no caso da equiparação salarial dos procuradores do Estado. Esta semana, um novo Tribunal de Julgamento se forma para julgar o processo de impeachment da compra dos 200 respiradores da China.

Mais surpreendente ainda foi a absolvição da vice-governadora Daniela Reinehr (sem partido), em um voto aparentemente despretensioso do deputado Sargento Lima (PSL), que alterou profundamente todas as expectativas na sessão de julgamento.

A decisão foi um balde de água fria nas pretensões do presidente da Alesc, deputado Julio Garcia (PSD), que estava a um passo de colocar a mão na caneta de governador.

Na tarde de sábado, após o resultado que decretou seu afastamento, Moisés chamou jornalistas na Casa D’Agronômica para se manifestar —diferente de Daniela, que acompanhou o impeachment no plenário da Assembleia, Moisés manteve a agenda normalmente e viajou ao Sul do Estado para inaugurar obras.

O governador reconheceu, talvez pela primeira vez, certa falta de habilidade política para contornar situações e evitar chegar ao ponto que chegou e classificou a decisão do afastamento como política e não técnica. Moisés acredita em absolvição no julgamento dos procuradores, mas antes disso poderá enfrentar um novo pedido de afastamento do cargo no caso dos respiradores.

Diálogo com a vice

Moisés e Daniela foram eleitos em uma campanha unida em torno da eleição do presidente Jair Bolsonaro. Mas os dois se afastaram ao longo da gestão. Moisés trocou farpas com o presidente e se descolou das bandeiras bolsonaristas. Mas uma reaproximação foi ensaiada nos últimos meses, após a instauração do processo de impeachment. Sobre o assunto, Moisés disse: “Conversei com a vice-governadora e colocamos a disposição dela todo o primeiro escalão do governo. São mais de 50 estruturas de governo e eu me ofereci, inclusive, para nos reunirmos todos de uma vez só, mas hoje à tarde, ainda, ela se reúne com as principais estruturas do nosso secretariado, com as principais pastas que vão conversar com ela e facilitar, esse foi meu pedido, esse processo de transição, que chamamos, porque, a partir de agora, quando você pergunta se terá muitas modificações no governo, a partir de agora, deixo de fazer o processo de gestão e a vice, mesmo que de forma interina, tem a liberdade de exercer as suas escolhas.

Política no afastamento

Moisés disse que vai buscar dialogar com os deputados, enquanto responde ao processo de impeachment. “Eu me dediquei muito a gestão pública e talvez não tenha me dedicado tanto a gestão política. Mas eu penso que, sim, é um período que me afasto da gestão e vou me dedicar a estabelecer esses elos com as lideranças políticas do nosso estado. Tenho convicção de que esse processo deve ser arquivado, mesmo com o arquivamento e para isso, a gente precisa, de fato, dialogar com o parlamento e é isso que vamos intensificar.

Dois impeachments

Questionado onde acha que errou para estar respondendo a dois processos de impeachment ao mesmo tempo na Assembleia, Moisés se diz inocente nos dois casos: “Os meus processos de impeachment não tem justa causa, isso a gente pode entender como funcionou ontem [sexta], através dos votos incisivos dos desembargadores, que conhecem o assunto, afinal, discutir direito cabe aos magistrados, então, ninguém melhor que os magistrados em número de quatro para discutir esse direito, que é uma decisão que ainda não foi consolidada de fato, não foi pacificada dentro do próprio poder judiciário, há uma complexidade no tema e não há justa causa. No segundo processo de impeachment, também não há justa causa. Entendemos que tanto o processo de compras, enfim, de escolhas de parceiros para fornecer à administração pública não é ato do governador”.

Bolsonarismo

Na coletiva Moisés deixou claro a intenção de se reaproximar do presidente Bolsonaro. “Entendo que nunca nos afastamos. Quando falo de aproximação com o governo é as mesmas práticas. Nosso colegiado aqui da administração pública é técnico, que é o que se repete lá no governo federal. Nós combatemos arduamente a corrupção, temos atitudes de integridade, transparência, de boa governança com os nossos órgãos de governo e acreditamos que isso também é feito em Brasília. Então eu vejo esse tipo de alinhamento na nossa gestão.