FUMPREVI: Dívida entre prefeitura e “Fundão” pode comprometer futuras gestões

Rombo entre entidades é de R$ 294 milhões. Debate estuda solução para evitar problemas nesta e nas próximas administrações

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Atualizado há 8 anos

O Fundo de Previdência Social dos Servidores Públicos Municipais de União da Vitória (Fumprevi) está no centro de uma polêmica sobre o custo da dívida do Poder Executivo com a entidade que cuida, entre outras coisas, das aposentadorias dos servidores municipais. A Previdência Social é um seguro que garante a renda do trabalhador e de seus dependentes em caso de doença, desemprego, acidente, morte, velhice, gravidez, aposentadoria e até mesmo em caso de prisão do titular.

Existem essencialmente dois regimes previdenciários no Brasil: Regime Geral de Previdência Social (RGPS ou INSS) e os Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS). O primeiro abrange a iniciativa privada (empresas, em geral) e o segundo é aplicável somente aos servidores públicos efetivos.

Depois da promulgação da Constituição de 1988, surgiu a oportunidade de os entes públicos criarem seus próprios regimes previdenciários. Estados e municípios que se queixavam das alíquotas do INSS, queriam aumentar o caixa, diminuindo os repasses para custeios de aposentadorias. Em União da Vitória, um grupo de vereadores e o secretário de Planejamento da época, Vilson Domingues, já falecido, foram até Londrina (PR) para conhecer o novo regime que estava conquistando o setor público.

A comitiva voltou entusiasmada e convenceu o então prefeito Mario Riesemberg (1989-1991), também já falecido, de que o novo regime traria uma economia substancial aos cofres da prefeitura. À época o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais foi contra, assim como foi o Magistério Municipal.

Nem com todo o movimento contra Riesemberg descartou a ideia. Ficou definido que o regime passaria para o RPPS. A alíquota agradou em cheio aos dois lados contribuintes, o executivo e os próprios funcionários: 4% sobre os proventos de cada funcionário da ativa e outros 4% da prefeitura. Isso representava uma boa economia para os dois lados. Pelo INSS a alíquota base já era de 20% para o empregador e 8% para o funcionário.

O Fumprevi, o Fundo de Aposentadoria Municipal, nasceu em 27 de outubro de 1991. A partir daí, o Regime Próprio de Previdência Social é adotado. No entanto, somente em 29 de dezembro de 1992, o então prefeito de União da Vitória, Fernando Bohrer, sancionou a Lei Nº 1929/92, que instituiu o regime.

Também em 1992 foi criado o Fundo para Custeio Previdenciário da Aposentadoria e Pensões dos Funcionários da Administração Pública Direta e Indireta do Município de União da Vitória (Fumprevi). Até a implantação deste regime próprio, os funcionários públicos municipais se aposentavam pelo RGPS.

A diferença de regime previdenciário CLT e RPPS pode ser entendida pela definição de cada uma das propostas para aposentadoria. A CLT é uma norma legislativa de regulamentação das leis referentes ao direito do trabalho e do direito processual do trabalho no Brasil. Já o RPPS é o regime previdenciário dos servidores titulares de cargo efetivo da União, dos Estados e dos Municípios, excluídos aí os integrantes de cargos exclusivamente em comissão, empregos públicos e cargos temporários.

O RPPS assegura a proteção do trabalhador contribuinte e seus dependentes, em situações de perda, temporária ou permanente, da sua capacidade de trabalho, seja por invalidez, idade avançada ou falecimento, para fins de aposentadoria ou pensão.

Cálculo compromete investimentos

Desde julho do ano passado a prefeitura teve de pagar em seis parcelas, de julho a dezembro, R$ 3,6 milhões. Com a crise econômica, faltou dinheiro e, para não chegar no final do ano com o caixa no vermelho, o prefeito Pedro Ivo Ilkiv propôs ao Fumprevi a troca de um terreno do município pelas quatro últimas parcelas do ano com o fundo previdenciário. A troca foi aceita.

Para este ano, o cálculo atuarial prevê uma dívida consolidada de R$ 294 milhões. A prefeitura terá de pagar em 2016, portanto, R$ 5,2 milhões, com a dívida com o Fumprevi, fora os juros de R$ 17 milhões. Logo, o Executivo prevê gastos estimados em mais de R$ 23 milhões com o Fumprevi. A receita total para o ano é estimada em R$ 161,8 milhões.

Cálculo Atuarial

O cálculo atuarial é um método matemático que utiliza conceitos financeiros, econômicos e probabilísticos para determinar o montante de recursos e de contribuições necessárias ao pagamento de despesas administrativas e benefícios futuros, como aposentadorias e pensões a serem concedidas, agora e no futuro. Ele sempre é realizado no início de cada exercício. É obrigatório e deve ser realizado por um profissional, o “atuário”. No caso de União da Vitória, o cálculo atuarial prevê a definição do valor da dívida da prefeitura com o Fumprevi, estabelece a forma de pagamento, os juros anuais da dívida e a amortização da dívida em cada ano.

Contribuintes

De acordo com o departamento de Recursos Humanos (RH) da prefeitura de União da Vitória, 1339 funcionários estão na ativa e são contribuintes do Fumprevi. Esse número poder variar a cada mês por conta de funcionários que entram, se aposentam ou deixam o serviço público. No entanto, a variável é ínfima e não altera os valores significativamente. Segundo o setor contábil, o valor total repassado por mês para o fundo é de R$ 960 mil. Em um ano, portanto, o repasse alcança os R$ 11,5 milhões.

No momento, não existe nenhuma discussão para a solução do Fumprevi. Mas, o assunto é tratado individualmente por alguns vereadores que insistem em chamar a atenção do executivo para a situação.

Projeto prevê alteração de repasses

Enquanto se fala muito no peso do cálculo atuarial nas despesas da prefeitura, chegou ao Poder Legislativo o Projeto de Lei nº 30/2016, que altera a Lei 4531/2015. Segundo o texto da nova proposição, o município realizará o aporte adicional de R$ 5,2 milhões, indicados no cálculo atuarial para 2016, sendo R$ 2,1 milhões em dinheiro, em 12 parcelas. Desse valor, a Uniuv, que é uma fundação, mas que pertence ao município, terá de pagar R$ 684 mil ao Fumprevi e outros R$ 12 mil ao Instituto de Assistência aos Servidores (IMAS). O percentual não conta com os juros de R$ 17 milhões que o cálculo apresenta.

Já a Câmara de Vereadores teria que desembolsar R$ 30 mil, enquanto que a administração direta arcaria com outro R$ 1,4 milhão. Para fechar a conta, a diferença de R$ 3 milhões se dará por meio da “dação” em pagamento (quando o credor aceita que o devedor dê fim à relação de obrigação existente entre eles pela troca do objeto da prestação) de um lote com área de 4,4 mil m², localizado na Rua Marechal Deodoro, no centro do município. O Projeto de Lei foi recebido pela Câmara e já tramita nas comissões permanentes. O projeto deve ser discutido e votado no plenário do legislativo nos próximos dias.

O cálculo atuarial deveria ter sido usado desde a criação do fundo de aposentadorias e pensões. No entanto, o processo teve início apenas em 2009. Outra constatação é que a diferença entre as alíquotas praticadas pelo RPPS e as do INSS, implicam no déficit demonstrado no cálculo atuarial. Sendo assim, o fundo seria menos deficitário se tivesse mantido às alíquotas de cobrança do INSS.

Mesmo com 20 anos de existência, o RPPS nunca recolheu valores comparáveis com o INSS, e não estipulou um teto máximo de aposentadorias, como faz o regime nacional. Hoje, ainda são recolhidos os 16% da prefeitura e outros 11% do contribuinte trabalhador do município, alíquota consideravelmente distante dos 20% do empregador do regime CLT e dos 8% recolhidos pelos trabalhadores da iniciativa privada.

Dificuldades de acesso

Entre 2013 e 2015, 168 servidores se aposentaram, segundo divulgação da página do Fumprevi na internet. Para consultar a relação basta acessar www.fumpreviuva.com.br e acessar a lista. No entanto, a reportagem encontrou dificuldades para saber o número de servidores ativos e inativos a cada ano desde a implantação do fundo.

A presidente do Fundo, Dilmara Aparecida Baniski, se comprometeu em disponibilizar por e-mail alguns dados para a confecção desta série de reportagens. Mas, quando foi cobrada sobre os dados, uma funcionária disse que Dilmara estaria viajando e que os funcionários não dispunham ou não tinham autorização para informar o material. Até o encerramento desta edição não foi possível conseguir novo contato com a presidente do Fumprevi.

 * Esta é a primeira de uma série de reportagens sobre a dívida da prefeitura com o Fumprevi.

A trajetória do RPPS em União da Vitória

Fernando Bohrer (1991 – 1992)

No penúltimo dia do seu mandato, em 29 de dezembro de 1992, sancionou a Lei Nº 1.929/92, que criou o Fumprevi. Não teve participação nas atividades do fundo de pensão e aposentadoria do município.

Airton Roveda (1993 – 1996)

Começou a arrecadar dos funcionários e a pagar pelo Executivo as alíquotas de recolhimento definidos em lei: 4% do empregador (prefeitura) e outros 4% de cada funcionário da ativa. Os pagamentos foram feitos em atraso por várias oportunidades, fazendo a dívida crescer. Em agosto de 1996, pediu R$ 300 mil* como empréstimo ao Fumprevi. A verba foi aplicada no término de obras em andamento. Roveda deveria pagar o empréstimo em duas parcelas. Não pagou nenhuma. No final do mandato, aprovou uma segunda lei e emprestou R$ 1,4 milhão* do Fumprevi. Usou o dinheiro para refinanciar a dívida anterior com o próprio fundo. Do empréstimo, R$ 812 mil* foram usados para cobrir o passivo com o próprio Fumprevi e os outros R$ 588 mil* para pagar o 13º salário dos funcionários da prefeitura.

Pedro Ivo Ilkiv (1997 – 2000)

Deveria pagar a dívida contraída por Roveda, com a sua própria anuência, em 11 parcelas de igual valor. Não pagou totalmente, nem a primeira parcela. Deveria quitar a parcela no valor de R$ 140 mil*, porém só pagou R$ 100 mil*. As outras dez parcelas nunca foram quitadas. Recolheu as contribuições e repassando para o Fumprevi, atrasou os repasses dos últimos meses de seu governo. Contudo, a alíquota foi reajustada para o empregador (município) para 8%. Os servidores continuaram a pagar 4%, ainda abaixo da alíquota do INSS (20% para empregador e 8% para o funcionário).

Hussein Bakri (2001 – 2008)

À pedido do Tribunal de Contas do Paraná (TCE/PR), enviou à Câmara de Vereadores uma lei para reestruturar o Fumprevi. A lei foi sanciondada no dia 11 de novembro de 2008, um mês antes de terminar seu segundo mandato. A lei aumentou as alíquotas de contibuição de 8% para 12%, para a prefeitura e de 8% para 11%, para os funcionários municipais. A lei permitiu, para efeitos contábeis, depois de uma auditoria externa, o reparcelmaneto das dívidas atrasadas e obrigou a administração recolher em dia a contribuição para os cofres do Fumprevi.

Carlos Alberto Jung (2009 – 2012)

Recolheu as contribuições dos funcionários, do executivo e repassou ao Fumprevi. Enviou à Câmara de Vereadores um Projeto de Lei (3929/11) para atualizar as alíquotas de contribuição para o Fumprevi pela terceira vez. Pela Lei, a administração passou  a recolher 16% e a alíquota de 11% para os servidores ativos, inativos e pensionistas, desde maio de 2011.

Pedro Ivo Ilkiv (2013 até hoje)

Continua pagando o parcelamento das dívidas da prefeitura com o fundo, obedecendo as leis anuais que tratam sobre a forma de amortização do déficit técnico atuarial. Segundo o Fumprevi, o poder executivo vem recolhendo integralmente as contribuições e repassando para o fundo.

*Dados da época