IBGE: negros vivem com metade de gastos de brancos

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Atualizado há 3 anos

As famílias chefiadas por negros no País vivem com praticamente metade do total despendido pelas famílias que têm como referência uma pessoa branca. O fenômeno inclui gastos essenciais, como alimentação, moradia e acesso à saúde. Os negros têm menos renda disponível do que os brancos em todos os estratos sociais, mesmo na faixa dos mais ricos. Os dados são da Pesquisa de Orçamentos Familiares 2017-2018, divulgada ontem pelo IBGE.

As famílias brasileiras tinham uma despesa média total per capita de R$ 1.667,90 em 2018. No entanto, entre as famílias que tinham uma pessoa branca como referência (alguém que pague ao menos uma das contas da casa), esse valor subia a R$ 2.279,19, enquanto a despesa per capita nas famílias chefiadas por pretos ou pardos alcançava somente 53% deste valor: R$ 1.207,11.

O cálculo considera as despesas monetárias, que foram efetivamente pagas com recursos financeiros, mas também as não monetárias, que incluem o consumo de bens e serviços públicos como educação e saúde, doações e produção própria de alimentos.

A diferença nas despesas era considerável mesmo nos gastos essenciais. O gasto per capita com alimentação das famílias chefiadas por brancos era de R$ 269,44, ante R$ 181,60 entre as famílias com chefes negros. Na habitação, a despesa entre os brancos alcançava R$ 644,31, ante R$ 330,72 entre os negros. Na assistência à saúde, o gasto per capita era de R$ 183,94 entre os brancos ante R$ 94,99 entre os negros.

Para Daniel Duque, pesquisador da área de Economia Aplicada do Ibre/FGV, o fenômeno é estrutural, resultado de uma herança da escravidão no País que não encontrou reparação, mas também dos entraves ainda enfrentados pelos negros no mercado de trabalho atualmente, com mais dificuldade de inserção em empregos e pior remuneração do que os brancos com mesma qualificação e função.

“Até hoje, no mercado de trabalho, esses trabalhadores têm mais dificuldade de crescer por conta da percepção discriminatória.”

Kleber Onorato, de 45 anos, exemplifica os dados do IBGE. Morador da Brasilândia, ele trabalha em uma distribuidora de gás na região. Vive com mais seis pessoas na mesma casa e é o único que possui renda fixa na família. Em um mês bom – se “correr mesmo” -, diz Onorato -, consegue cerca de R$ 1,5 mil.

Ele cuida dos três filhos da irmã que faleceu, além de dar apoio aos outros dois irmãos e mais uma sobrinha pequena. O irmão, de 41 anos, faz bico de eletricista e a irmã, de 30, faz trança em cabelos. “Agora, ele comprou uma máquina que faz chinelos e, se Deus quiser, vai dar certo. Para a minha irmã, mais para frente, estou tentando montar um espacinho para ela fazer os cabelos”, diz.

O vendedor de gás conta que, com a pandemia do novo coronavírus, a situação ficou ainda mais complicada. “Estamos na luta, correndo atrás para sobreviver.” Ele e os irmãos estão recebendo o auxílio emergencial do governo para complementar a renda neste período.( COLABOROU MARINA ARAGÃO)