Ibovespa ignora indefinição externa e renova máximas com privatização no radar

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Atualizado há 3 anos

Depois de uma abertura discreta, o Ibovespa passou a renovar máximas, testando os 119 mil pontos, com a máxima alcançando 119.167,14 pontos. Embora os desdobramentos da covid-19, que tem reacendido cada vez mais o debate de retomada do auxílio emergencial, continuem a apoiar prudência entre os investidores, as palavras do presidente Jair Bolsonaro e do ministro da Economia, Paulo Guedes, hoje, parecem ter agradado.

Em meio a temores de paralisação da agenda de privatizações, o presidente reforçou hoje o compromisso do governo de avançar nessa pauta, além de falar em medidas para melhorar o ambiente de negócios. “Pretendemos acelerar os leilões de concessões e privatizações, em especial, no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), que tem uma carteira de projetos estratégicos de longo prazo, baixo risco e com taxas de retorno atraentes e estáveis”, declarou.

“O governo começa a dar um sinal, uma indicação um pouco diferente, de comprometimento do teto de gastos, e isso é muito importante”, afirma o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira, lembrando que se é necessário colocar mais medida de auxílio para a população enfrentar a pandemia de covid-19, que se dê condicionantes para isso.

Como o esperado, as ações da Eletrobras reagiram em queda ao anúncio de saída do presidente da estatal, Wilson Ferreira Junior. Os recuos expressivos até fizeram com que os papéis PNB entrassem em leilão no início dos negócios. Depois, reduziram a velocidade de queda (-4,68%). Já ON cedia 6,91%. Em contrapartida, as ações da BR Distribuidora, onde o executivo deverá trabalhar, lideram a lista de maiores altas do Ibovespa, com quase 14%.

Para Eduardo Cubas, sócio da Manchester Investimentos, o discurso alinhado de Bolsonaro e Guedes agradou pois até então a direção adotada era outra, “numa indicação de intervencionismo”. “A ideia de que o auxílio emergencial é um gasto emergencial, para conter a pandemia e que não deve se tornar um benefício permanente agrada. Para isso, o governo pretende cortar gastos. Além disso, a indicação de encaminhamento da agenda de reformas, de privatização foi bem recebida”, avalia.

Apesar da valorização do Ibovespa na volta do feriado ontem, quando a Bolsa ficou fechada por causa da celebração dos 467 anos da cidade de São Paulo, os entrevistados fazem ponderações. “O mercado está dando o benefício da dúvida hoje. Vamos ver se a comunicação desta terça se transformará em atitudes”, afirma Cubas.

Além disso, o quadro externo inspira cuidados em meio aos desdobramentos dos efeitos da pandemia de covid-19. “Infecção por covid-19 em diferentes países, medidas restritivas, vacinação demorada e necessidade por mais estímulo fiscal e monetário”, diz o economista-chefe do banco digital ModalMais, Álvaro Bandeira.

“Internamente, há essa forte pressão política contra Bolsonaro e a saída de Ferreira Júnior faz com que a possibilidade de privatização se alongue. A capitalização da empresa bem como de outras companhias é necessária”, afirma Bandeira. Ele acrescenta ainda a crescente onda de manifestos pedindo a saída do presidente da República, Jair Bolsonaro, como fonte de influência nos negócios. No fim de semana, houve protestos pedindo a saída do mandatário, sob o argumento de que ele agiu com negligência na condução da pandemia de covid-19, agravando a crise.

Às 11h52, o Ibovespa subia 1,17%, aos 118.757,33 pontos, após máxima aos 119.167,14 pontos.

O dólar teve nesta terça-feira a maior queda ante o real em mais de sete meses, recuando mais de 3%. A perda de força da moeda americana no exterior ajudou, mas o peso determinante hoje veio do mercado doméstico. O governo com discurso alinhado voltando a sinalizar responsabilidade fiscal e a ata da reunião do Banco Central apontando para a chance de os juros subirem mais cedo do que o previsto pelos economistas ajudaram a retirar pressão do câmbio. Operadores relataram ainda entrada de fluxo externo hoje. Com isso, investidores desmontaram posições contra o real que vinham sendo construídas nos últimos dias, marcado por piora do risco fiscal. Assim, a moeda americana devolveu parte da valorização recente, que havia superado 6% apenas em 2021.

No fechamento, o dólar à vista encerrou o dia em baixa de 3,30%, a R$ 5,3269 – foi a maior queda porcentual diária desde 2 de junho de 2020 (-3,34%). No mercado futuro, o dólar para fevereiro caiu 2,07%, a R$ 5,3570.

O dólar operou todo o dia em queda e, na mínima, ao final da tarde, caiu a R$ 5,31. A divulgação da ata da última reunião do Banco Central, vista como mais “hawkish” pelos participantes do mercado, ou seja, mais propensa a elevar juros, levou bancos como Itaú Unibanco, JPMorgan, Credit Suisse, Bank of America e Barclays a anteciparem as previsões de alta de juros no Brasil. Alguns, como o Itaú e o Credit, vendo chance de o movimento ocorrer já em março.

Para o gerente da tesouraria do Travelex Bank, Marcos Archina Weigt, o fato de o Brasil ter cortado juros em ritmo mais forte que outros emergentes foi um fator essencial para o real ter tido pior desempenho que seus pares nos últimos meses. O México, que está no seleto grupo de países classificados como grau de investimento, tem taxa básica de 4,25%, enquanto o Brasil, quem tem classificação três níveis abaixo, está em 2%.

“Outros emergentes também reduziram muito os juros em 2020, mas pararam antes do Brasil”, disse Weigt, citando outros mercados, como Índia, com juro básico de 4%, e África do Sul, com 3,5%. Assim, o Brasil passou a não receber mais capital de curto prazo que buscava retorno alto. Se a alta de juros ajuda a retirar pressão do câmbio, a situação fiscal segue como um limitador para a valorização do real, disse o executivo do Travelex. É preciso respeitar o fiscal, disse ele.

Nesse sentido, o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, falaram pela manhã em evento do Credit Suisse do compromisso fiscal do governo e do empenho em avançar com as reformas, inclusive as privatizações. Guedes disse que o auxílio emergencial pode voltar, mas dentro do teto e travando todo o resto do Orçamento.

“Temos que ver mais austeridade fiscal no Brasil este ano ou mercado vai continuar pressionado a dívida e a moeda brasileira”, avalia a estrategista global do JPMorgan Asset Management, Gabriela Santos. No ano passado, ela observa que houve grande tolerância com gastos fiscais mais altos, porque a economia mundial atravessava uma crise econômica de proporções históricas. “Em 2021, tem menos tolerância por gastos fiscais adicionais”, afirmou a estrategista do JP, em live do jornal Valor Econômico.

A curva de juros sustentou durante a tarde a desinclinação induzida desde cedo pela leitura da ata do Copom, que foi reforçada pelo discurso do governo de comprometimento com a disciplina fiscal e pela queda do dólar. O documento, considerado mais “hawkish” do que o esperado, capitaneou o movimento de alta das taxas de curto prazo e forte recuo das longas, ao revelar que os membros do colegiado discutiram a possibilidade de iniciar o aperto monetário já na reunião da semana passada. Com isso, as apostas de elevação da Selic ganharam força, com parte do mercado antecipando o cenário de abertura do ciclo para março. Na precificação para o próximo Copom, a curva já mostra maior probabilidade (em torno de 60% de chance) de um aumento de 0,5 ponto porcentual da taxa básica. O IPCA-15 de janeiro veio levemente abaixo da mediana das estimativas, mas com abertura considerada ruim, o que endossou a mensagem do BC.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2022 subiu de 3,393% no ajuste de sexta-feira para 3,425% (regular) e 3,400% (estendida) e a do DI para janeiro de 2027 caiu de 7,508% para 7,30% (regular) e 7,32% (estendida). O DI para janeiro de 2023 fechou a sessão regular e a estendida com taxa de 5,08%, de 5,199% no último ajuste, e a do DI para janeiro de 2025 terminou em 6,62% (regular) e 6,63% (estendida), de 6,80%.

No fim da tarde, a curva já tinha 40 pontos-base de aumento para a Selic em março, segundo a gestora de renda fixa da MAG Investimentos, Patricia Pereira, ou mais ou menos 60% de chance de alta de 0,5 ponto porcentual e 40% de possibilidade de alta de 0,25 ponto. “E a curva tem aumentos na casa dos 50 pontos mais ou menos o ano todo”, explicou.

Na ata, alguns membros do Copom julgaram que o BC deveria reduzir grau “extraordinário” de estímulos e que o início da normalização parcial deveria ser considerado. Várias instituições anteciparam o cenário de início do ciclo de contração monetária para março, entre elas Itaú Unibanco, Credit Suisse e BofA.

Na avaliação do operador de renda fixa da Nova Futura, André Alírio, a ata, mais os discursos do presidente Jair Bolsonaro e do ministro da Economia, Paulo Guedes, e o alívio do câmbio retiraram boa parte da pressão que as taxas vinham sofrendo na semana passada em função das preocupações com a volta do auxilio emergencial e do processo conturbado de vacinação contra a covid-19. “O mercado está devolvendo o que subia até sexta-feira”, disse.

Enquanto o presidente prometeu manter o compromisso com a regra do teto de gastos e a aceleração da agenda de privatizações, Guedes indicou que, caso o governo tenha de acionar um protocolo de crise, se o quadro da covid-19 no País se agravar, terá de haver contrapartidas. Era o que o mercado, tenso com a cada vez mais elevada chance de resgate do auxílio emergencial, queria ouvir. Tanto ele quanto Bolsonaro participaram de evento realizado pelo Credit Suisse pela manhã.

A terça-feira teve ainda o IPCA-15 de janeiro, que desacelerou a 0,78% (1,06% em dezembro), mais do que apontava a mediana das estimativas, de 0,81%, mas não foi o suficiente para evitar a alta da ponta curta. “Veio mais baixo do que o esperado, mas a abertura trouxe núcleos mais pressionados. Então, acaba indo no sentido do que apontou a ata”, explicou Patricia, da MAG.