ADOÇÃO: 9 mil esperando por uma família

País tem 8,7 mil crianças na “fila” da adoção. Mudanças na legislação tem dado agilidade aos processos

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Atualizado há 5 anos

ADOÇÃO | Rodrigo Kurth Quadro e Carolina Socha de Souza: adoção é tema sério, e emocionante também (Foto: Divulgação).
ADOÇÃO | Rodrigo Kurth Quadro e Carolina Socha de Souza: adoção é tema sério, e emocionante também
(Foto: Divulgação).

“Aceitação espontânea de (pessoa ou animal) como parte integrante da vida de uma família, de uma casa”. Essa é a definição de dicionário da palavra ‘adoção’. Na prática, adotar quer dizer muito mais. Muito mais, especialmente quando o adotado é um ser humano, uma criança ou adolescente, que esperou com carinho, com paciência, para encontrar sua família. E no País, são quase nove mil histórias esperando pela integração com novas famílias.

Dados do Cadastro Nacional da Adoção (CNA), divulgados na semana do Dia Nacional da Adoção (lembrado no dia 25), mostram que 8,7 mil crianças e adolescentes, aguardam a adoção e, aguardam por um filho, mais de 43 mil pretendentes. A conta que não fecha – deveriam sobrar pais interessados na adoção e a fila de espera seria zerada – além de ser fruto da exigência dos futuros papais (leia mais sobre isso no quadro) resulta também da burocracia de todo processo. Contudo, avanços na legislação – como a criação de um cadastro eletrônico em 2008, para a comunicação entre as varas de infância de todo o País – vem acelerando o trâmite de adoção – e enchendo de alegria a casa de milhares de famílias por aí.

Uma delas, é a casa do casal, Roberto e Cris. Eles moram no Vale do Iguaçu e algumas semanas, receberam uma princesa como filha, uma criança saudável que tem agora, três meses. Na “fila” há pouco mais de um ano, o casal, sem filhos, decidiu pela adoção após pensar muito sobre o assunto. “Em conversa com um casal de amigos nossos, fomos amadurecendo a ideia e entramos com o processo. Ele (o processo) leva um tempo, fizemos a documentação e depois de um ano, ficamos habilitados. A partir daí, entramos na fila de adoção”, conta Roberto. E foi agora, há poucos dias, que o casal recebeu o seu pacotinho tão esperado: uma menina, neném ainda. “No dia 2 de maio, eu estava no trabalho e recebi uma ligação do Fórum, que tinha um neném para gente. Eu chorei, me assustei e fomos receber o nosso neném”, conta, sorrindo, a mamãe de primeira viagem. “Antes de ver ela, estávamos muito emocionados. Quando pegamos ela, choramos uns cinco minutos sem parar. Foi meu presente de Dia das Mães. Ganhei o melhor presente da minha vida!”.

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), na última década, mais de nove mil adoções foram realizadas no País. Foi sobre este tema que o promotor, Rodrigo Kurth Quadro, e a oficial da Infância e Juventude, Carolina Socha de Souza, falaram em uma entrevista ao jornal O Comércio e à rádio CBN Vale do Iguaçu. Falando sobre os avanços, o magistrado ressaltou a necessidade da adoção. “Muitas crianças ainda esperam ser adotadas no Brasil”, disse.

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Filho não é mercadoria

Mas não raro, é tratado como tal. Especialmente os adotados. O perfil exigido pelos pretendentes é o principal entrave para a adoção. Na maioria dos casos, segundo o CNJ, a criança “escolhida” é branca, menina, com até quatro anos, que não seja portadora de nenhuma doença nem pertença a grupos de irmãos (se tiver irmãos, todos precisam morar juntos). Por isso, o número de pretendentes é bem maior do que o número de crianças à espera de um lar.

De acordo com o levantamento, dos inscritos no CNA, apenas 34,53% são indiferentes à raça do filho pretendido. Dos interessados, 91,03% manifestaram o desejo por adotar brancos. Aceitam pardos 61,12% e negros 34,28% dos pretendentes.

A maior parte dos inscritos (82,76%) tem interesse de adotar apenas uma criança. Segundo o CNA também, 82,14% manifestaram o desinteresse por adotar irmãos. Outros 80,28% negam-se a adotar até mesmo gêmeos.

No que diz respeito ao gênero pretendido, 33,23% dos pretendentes manifestaram interesse por adotar meninas e apenas 9,60% desejam meninos. Indiferentes ao sexo da criança/adolescente somam 58,89% dos inscritos no Cadastro Nacional de Adoção.

Com relação à idade, a preferência é praticamente por bebês 17,97% desejam crianças até um ano de idade; 19,90% de um aos dois anos; 20,50% de dois aos três anos; 18,32% de três aos quatro anos. Pessoas interessadas em adotar crianças com mais de oito anos somam menos de 1%m tema muito importante”. Quadro e Carolina, atuam no Fórum de Porto União.

O Cadastro Nacional de Adoção foi criado pelo Conselho Nacional de Justiça, em abril de 2008, para reunir informações a respeito de pretendentes e crianças e adolescentes disponíveis em todo o Brasil. O objetivo é tornar mais ágil o processo de adoção e possibilitar a realização de políticas públicas na área

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Entrevista

Jornal O Comércio (JOC) – Temos o que comemorar no Dia Nacional da Adoção?
Rodrigo Kurth Quadro (Quadro) – Estamos caminhando para isso. Já foi ruim. As pessoas já conseguem compreender de maneira mais completa. Temos mais interessados em adotar do que crianças para serem adotados. E porque a matemática não fecha? Muito, por que os adotantes exigem um perfil. Não podemos julgar, claro, mas a maioria quer um neném branquinho, de olho clarinho, menininha. Mas nas unidades de abrigo, são poucos nenês, são crianças maiores, que não estão no perfil dos interessados. E infelizmente, essas pessoas sedentas de amor, não são adotados. Criança precisa de amor. Não importa se é preto, branco, amarelo.

JOC – A relação fica realmente próxima entre os pais adotantes e as crianças?
Carolina Socha de Souza (Carolina) – Existem casos e casos. Ocorre muito de acontecer já essa conexão, essa aproximação. Às vezes, o vínculo é construído aos poucos, assim como acontece com os filhos biológicos. Sobre o perfil da criança, lembro que depois dos três anos, a gente já considera como adoção tardia.

JOC – Muitos pais que vão adotar, temem alguns riscos, tem medo de alguma eventual doença ou de algum problema. Mas com os filhos biológicos é a mesma coisa, certo?
Carolina – Lógico! É igual sim. Quando os pais adotam uma criança, ela vai ter acesso à carteira de vacinação, ao histórico dela. Isso é um preconceito nosso!

JOC – Como funciona os abrigos para crianças e adolescentes?
Quadro – Não e uma feira de adoção, onde se vai lá e escolhe o produto. Porto União está agora com o início do programa de apadrinhamento afetivo. A pessoa se inscreve e vai ser um orientador, pode passear final de semana, levar num cinema. A gente pensa que essa aproximação é uma ponte para a adoção. As vezes a pessoa não está pronta para a adoção mas quer dar amor.
Carolina – Nem todas as crianças do abrigo estão para a adoção. Pela Lei, precisamos fazer com que a criança tente voltar para sua família biológica. Na cidade, temos 13 crianças e adolescentes acolhidos e nenhum apto para a adoção. Com o programa (Apadrinhamento Afetivo) visa atender os maiores um pouco, com nenhum vínculo com a família.

JOC – Quem pode adotar?
Quadro – A Lei não faz diferenciação. Podem ser pessoas solteiras, em uniões socioafetivas. Ela apenas vai ter que cumprir com os requisitos que se exige nos casais, de homem e mulher. Não precisa ser rico. Tem que ter condições mínimas e amor. A fila vai andar conforme andam as coisas. Basta ter amor e vontade, dentro dos critérios da Lei.


Guia para pretendentes

O CNJ disponibiliza em seu portal, a publicação ‘Três vivas para a adoção’, uma espécie de guia com um passo a passo explicativo, informações sobre busca ativa e os diversos tipos de adoção. É possível ler ainda depoimentos de famílias que se formaram por meio do processo, com histórias envolvendo adoção tardia e adoção de crianças com deficiência, entre outras.

(Foto: Divulgação/CNJ).
(Foto: Divulgação/CNJ).

Quem pode adotar

O Estatuto da Criança e do Adolescente estipula que os adotantes sejam maiores de idade, e tenham no mínimo 16 anos a mais que o adotado. Solteiros, viúvos e divorciados com condições socioeconômicas estáveis também podem se candidatar. Os pretendentes não podem ser dependentes de álcool e drogas, ou morar com pessoas que tenham esse perfil.

Os interessados devem procurar o fórum munidos do RG e de um comprovante de residência. Após análise e aprovação da documentação, eles serão entrevistados pela equipe técnica da Vara da Infância e da Juventude.