PRECONCEITO? Bonecas negras são minorias e mais baratas

Apesar da maioria se declarar negro no País, apenas 3% das bonecas correspondem a cor. Valores dos brinquedos tem diferença

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Atualizado há 5 anos

Flagrante: preços diferentes em bonecas iguais, mas de cor diferente (Fotos: Mariana Honesko).
Flagrante: preços diferentes em bonecas iguais, mas de cor diferente (Fotos: Mariana Honesko).

O Sul do País é povoado por gente branca, fruto da imigração europeia, que colocou na região ucranianos, italianos, alemães. Mas, mesmo assim, a união de casais diferentes, misturando sangue e raça, garante o nascimento de indígenas e de negros. Olhando para o Brasil como um País continental, a diferença é grande: dados do IBGE mostram que a maioria se declara de cor negra.

Contudo, no viés pedagógico, a produção de brinquedos não segue o perfil brasileiro. Pesquisa da ONG Avante, mostra que apenas 3% das bonecas, por exemplo, são negras. A maioria absoluta, é branca, de cabelos e olhos claros.

Diante dessa lacuna, coletivos se espalharam fronteira adentro, tudo, para tentar responder à uma pergunta: ‘cadê nossa boneca?’. Aliás, esse questionamento se “doou” e batizou a campana realizada em Salvador (BA), cidade com maior número de negros da América Latina, com mais de 75% de declarados negros e pardos. A falta de bonecas negras no mercado – e outras discussões sobre o tema – foi o mote para o projeto.

Na rede social, outras organizações se manifestam favoráveis a mesma discussão. Basta uma simples pesquisa na caixa de busca para entender como o tema sensibiliza. Por exemplo, novamente conforme a Avante, dos 1945 modelos de bonecas encontrados nos sites das fabricantes, apenas 131 são negras. Já entre as varejistas online, apenas 3% das bonecas disponíveis para compra são negras.

Apesar de pouco, o número já foi bem menos expressivo. Á bem pouco tempo, era raro encontrar uma boneca preta ou, marrom, como dizem as crianças. Três ainda é pouco, longe do ideal, mas um avanço.

Vale do Iguaçu

Encontrar uma boneca preta não é algo tão simples. Embora elas estejam nas prateleiras, a quantidade, em unidades, é muito menor. Mas, o pior, é a diferença de preços entre os produtos. Em uma grande rede, a reportagem registrou, com imagens, dois modelos idênticos de boneca. Ambas, da mesma marca e com praticamente todos os itens iguais. Mas, a diferença de preços era grande: as bonecas pretas estavam sendo vendidas R$ 70 a menos que as brancas. E parecia promoção, com desconto, já que as etiquetas dos brinquedos eram discrepantes.

Por nota, a assessoria da loja se manifestou, e negou a diferenciação. “Se o modelo e a coleção forem os mesmos, as duas bonecas terão valores iguais. Porém, se os modelos e as coleções são diferentes, os valores também serão diferentes. Tudo depende das funcionalidades das bonecas”, diz o texto.

Para o empresário, Silvio Iwanko, que tem em sua loja um setor exclusivo de brinquedos a variedade de opões, estilos e cores de bonecas vêm crescendo. Conforme ele, a escolha da cor da boneca “é independente da cor da pessoa que a está escolhendo; tanto os pais quanto às crianças são variáveis”. Iwanko garante que não existe discriminação, tampouco, diferença de valor na indústria fornecedora ou na loja. Como exemplo de boneca negra, ele destaca a Tayla, “um exemplo de beleza e de grande procura”.

Empresário, Silvio Iwanko, elogia boneca Tayla: “exemplo de beleza e de grande procura”
Empresário, Silvio Iwanko, elogia boneca Tayla: “exemplo de beleza e de grande procura”

As bonecas negras são protagonistas nas mãos de artesãos. Quem sabe costurar, pregão botão, dar vida para tecidos e linhas, transforma pano em criação. É o que vem fazendo as voluntárias da Casa de Apoio Amor Fraterno, em Porto União. No bazar e na sede da unidade, á vários modelos de bonecas pretas para a venda. Elas vêm com laços, fitas e boca colorida. Pelo Vale do Iguaçu, outras mãos de fada se espalham – e espalham a unanimidade das cores.

“Uma das primeiras bonecas que fiz eram negras. Fiz para uma professora usar na escola. Era um boneco que as crianças levavam para casa e faziam um diário sobre as aventuras com o boneco era muito legal”, conta outra artesã, Mariane Dobkovski. “As bonecas são parte importante para o crescimento e desenvolvimento das crianças e por incrível que pareça para muitos adultos também. Tenho algumas clientes que mandam fazer bonecas para elas mesmo”.

Artesãs confeccionam bonecas negras para venda no bazar: modelos variam de R$ 40 a R$ 70
Artesãs confeccionam bonecas negras para venda no bazar: modelos variam de R$ 40 a R$ 70
Personagens negros na literatura infantil

A presença de crianças e jovenzinhas negras na literatura é assunto para uma série de discussões. Tanto que o tema é frequentemente levado às inverdades e transformados em teses. Conforme os documentos, a opinião de quem estuda o tema é de que atualmente, alguns livros infantis apresentam personagens negros por meio da ilustração, sem que no texto apareçam registrados enfrentamentos étnico-raciais.

Na prática, o livro ‘Menina bonita do laço de fita’, de Ana Maria Machado, talvez seja um dos títulos de literatura infantil mais conhecido entre os professores, e o mais utilizado em trabalhos com as crianças para discutir sobre identidade, autoestima e pertencimento.

Para quem busca histórias com protagonistas negros, o site www.geledes.org.br dispõe de uma lista com cem títulos de obras da literatura infantil onde os personagens principais fogem ao estereótipo mais comum. São meninos e minas, negros e negras, em universos cheios de aventura.

A internauta Hemily Fhabiana Iwanusk mandou para a redação, a foto da bonequinha que tem casa
A internauta Hemily Fhabiana Iwanusk mandou para a redação, a foto da bonequinha que tem casa

Os pardos representam 53,6% da população brasileira, segundo dados do IBGE de 2014


O que VOCÊ pensa sobre isso?

Uma sondagem informal feita pela reportagem coletou algumas opiniões sobre o assunto, por meio das redes sociais. Lei alguns dos depoimentos dados pelos internautas:

“Quando eu morava aí, queria comprar uma boneca negra para minha filha, para que que ela soubesse que outras raças neste mundo de brancos do sul. Não encontrei em lugar nenhum. Tive que comprar em Minas Gerais” – Eliane França

“Lá na Havan encontrei algumas, mas não tinha nenhuma Barbie negra. Também senti falta de bonecas estilo plus size Chega de estereótipos. Devemos ensinar nossos filhos a respeitar as diferenças” – George Vanessa

“Falo isso sempre! O que encontramos? Bonecas loiras. Olhos claros. Agora achei preta só em Joinville e verdade o valor é quase o dobro. Também não encontramos bonecas deficientes, gordinhas. Como vamos ensinar a diferença se os padrões sempre são os mesmos? Loira, magra, cabelos lisos e olhos claros?” – Katiuscia da Silva Mehlan